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Veneza está afundando (1)




Inverno de 1976

Frio em Veneza. Chegamos de Turin, de trem. Tarde da noite. O quarteto logo se desfez. Subi as escadas antigas do hotel. Lá fora ficou a estação ferroviária. Rosa, uma das companheiras de viagem pegará o primeiro trem pela manhã com destino à Florença.


Logo, estou envolto nas coxas quentes de Vera Maria, envolto na pressa pelo amanhecer. No quarto ao lado, Clara, a mais friorenta, sofria com a madrugada gelada naquele hotel barato. Chovia em toda a borda italiana do Adriático.

O vento cortante do canal fazia brotar água nos olhos. O motor da lancha jogando óleo na água ajudava a tirar o brilho dos olhos da cidade, os canais. Contribuindo para a sensação de destruição de Veneza. Seu assassínio.

Os barcos estão ancorados em pequenos cais diante das grandes construções. Palacetes. Palácios antigos, prenhes de história e romantismo. As paredes estão sujas. Lodo. “A cidade afunda”, dissera um professor de geografia nos tempos do ginasial. No Rio de Janeiro. Nova Iguaçu.

Vera Maria transbordava de sensualidade e me aperta o braço: “Vamos?!”. “Não, Vera. As gôndolas são para turistas de verdade. Para os americanos, certamente. Não para nós”. Éramos praticamente mochileiros. A vontade era de abandonar aquela envolvente melancolia da cidade e voltar ao aconchego quente dos braços de Vera no quarto do hotel. Clara não saíra. Às voltas com uma enxaqueca.

Almoçamos num restaurante simples, até pobre. Bem poderia ser no Braz ou na Praça Mauá. Mas não era. Era na Veneza que está afundando. Vera, paulistana que morava nos arredores do Largo do Arouche falou com o garfo ornado de fettuccine a meio caminho da boca: “Esse vinho barato pode não ser lá essas coisas, mas, em se estando na Itália...”. “É...”. Assenti, mastigando em silêncio e pensei comigo: “Estamos na Europa. Longe de casa”. E soltei sem muita convicção: “Lá o sistema prostitui” e Vera pareceu não entender.

Depois ela contou que fizera um teste de emprego, que não dominava bem o inglês, mas que enrolara e conseguira a vaga para trabalhar em uma construtora brasileira, na Nigéria. Tempos depois me escreveria de Lagos, falando dos costumes locais. Do dialeto complicado falado pelo povo, da goela funda dos taxistas e suas bandeiradas estratosféricas e de bizarrices como irem à praia nus ou de abandonarem Mercedes-Benz pelas ruas.

Olhei os grandes olhos negros de Vera. Ela era dois anos mais velha. Bonita, com sardas na pele muito branca do rosto. Não sei porque me veio a lembrança, em São Paulo, quando vi várias jovens expostas aos fregueses, próximo a um prostíbulo nas vizinhanças da Praça Duque de Caxias. A polícia agora não tolera. Chega, espanca as meninas e as colocam dentro dos camburões.

Fora do restaurante fazia frio e caia uma chuvinha fina. Quase uma garoa paulistana. Como é triste Veneza! “Aqui a cidade está afundando, minha querida”, eu disse e ela retrucou dizendo que “lá o país está afundando...ou nuca houve um país”, disse num tom mais sério que o normal. - “Clara não vai curtir nada com aquela enxaqueca”, eu disse mudando o clima e Vera sorrindo apontou por sobre o meu ombro.

- “Você reparou?”, indicando a parede de azulejos brancos atrás de mim naquele restaurante de terceira categoria. Eram recortes de jornais e revistas com fotos coloridas da Copa do Mundo de 1970, no México. Incrível que mesmo seis anos depois ainda estivessem lá. E numa parede de uma cidade que está afundando, localizada no noroeste do país que fora fragorosamente derrotado na decisão daquela Copa. Estava lá a clássica foto da pirâmide humana com Pelé, Tostão, Jairzinho, Rivelino e Gerson. E uma manchete devastadora: “Azurra, caduta por timore”.

Que coisa antiga, comentamos. Já passara outra Copa e os recortes jaziam na parede, como que um castigo eternizado. A goleada na final. Algo imperdoável. Pelé rindo com muitos dentes, Tostão caolho, Jair Furacão, Riva a Bomba Santa e Gerson o fumante inveterado. Na época eram noventa milhões em ação...e quantos, sequer puderam ver os jogos pela TV!

- “O general-presidente era o Médici”, disse Vera olhando no vazio, mastigando lentamente a carne moída do molho Bolognesi. - “Lá o sistema prostitui. Lá o país está uma puta”, eu disse.

O restaurante era pequeno, estreito como um corredor. Umas três ou quatro mesas para duas pessoas cada. A nossa estava próxima daqueles recortes: Brasil tricampeão. Os abraços, o beijo do capitão na taça (quantas mães, sem seus filhos tiveram suas vozes e seus prantos abafados por aquele beijo em Guadalajara!? Uma corrente pra frente não nos deixou ouvir o grito de dor dos torturados, dos empalados nos porões, dos afogados, violentados, estuprados a cassetetes. O grito de gol foi mais alto. Não ouvimos o último grito de dor dos assassinados).

- “Os mexicanos foram uma espécie de brasileiros emprestados”, disse Vera. “Uma torcida emprestada”. Já era tarde e no dia seguinte estaríamos no trem de volta a Turin. Clara não estava no hotel. Melhorara da enxaqueca e saíra só, a desmiolada. Deixou um recado na recepção: Fui almoçar, não se preocupem. Vou conhecer a cidade, passear de gôndola. Tchau.

Subimos a escada serpenteada. A cama era grande e antiga. O colchão não era ortopédico, era largo e macio de afundar. Vera Maria pesava mais que eu. Ampla e macia. Branca, com sardas por todo o corpo. Branca e quente. Gemia junto com a cama. Lá fora a cidade afundando lentamente nos canais. Eu me afundando em Vera. O frio do inverno. A chuva fina e gelada. E Clara, lá fora, certamente pedindo informações num portunhol ininteligível.

Fine. 1) Veneza está afundando ficou em segundo lugar no concurso de contos promovido pela Universidade Federal de Juiz de Fora, em 1982.


 

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