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Foto do escritorMarlos Degani

SOBRE OS TEMPOS



Izabel Jaguaribe, em 2003, dirigiu e lançou um documentário supimpa sobre o Paulinho da Viola, com roteiro de Zuenir Ventura, chamado 'Paulinho da Viola ̶ Meu Tempo é Hoje'. Paulinho, por si só, dispensa comentários, diante de sua elegância exuberante, da ourivesaria fina da ampla discografia acumulada em mais de 58 anos de carreira e de tudo o que representa para a música brasileira de um modo geral. Nível máximo dos bambas, além de vascaíno de quatro costados, como a maioria dos sambistas do século XX, porque o Vasco da Gama é o clube com mais apelo popular entre os morros cariocas, o subúrbio, a população pobre e sofrida e, referente à questão do preconceito racial, não obstante, foi o primeiro time onde um negro pôde jogar uma partida oficial de futebol no Brasil. Identificação pouca é bobagem. O Flamengo tem a maior torcida, porque é um clube de massa, assim como o Corinthians, mas o Vasco foi e continua sendo o mais popular do Brasil, quiçá do mundo.


Num determinado momento do documentário, Paulinho visita a casa onde foi criado em Botafogo, no Rio, e cravou algo que jamais esquecerei: com uma voz pausada e, na minha opinião, emocionada, dizia que sentia saudades daquele tempo de criança, enquanto quase acariciava a moldura da janela aberta à vila de casas... Mas que não sentia nostalgia, porque esse sentimento parecia-lhe inadequado, como se quem o sentisse, estivesse preso àquela determinada época, e concluiu, paulinhodaviolamente, doce e incisivo: ̶̶ Meu tempo é hoje! E, a partir daí, tive um melhor discernimento do que é saudade e do que é nostalgia. E que o meu tempo também é hoje! E sempre será hoje, pois mesmo que o amanhã chegue (lembrei do Tavares, o melhor de todos, e fico devendo uma crônica sobre o grande e polêmico Chico Anísio), será, inevitavelmente, hoje, mas de amanhã. Certo, Biscoito?


Com tudo isso bem entendido e posto, noto esse problema contumaz entre gerações diferentes que é o de confundir sentimentos como a saudade de algo ou de alguma coisa, com uma prisão àquela determinada época que passou, a do primeiro amor, a dos bailes de então, a dos ídolos esportivos, a dos filmes, a das festinhas, criando uma silenciosa tendência que desqualifica o que é atual em prol de um suposto patamar superior sobre o que existiu no passado, especialmente em relação às artes em geral, costumes sociais e econômicos. E por quê? Justamente porque talvez não haja muita clareza acerca desta linha tênue entre saudade e nostalgia. Pessoalmente, acho muito perigoso, feito pisar em areia movediça, taxar negativamente a atualidade em detrimento do passado entorpecido de emoções bem guardadas. E o emocional é que nem aquilo: cada um tem o seu.


Em relação à música, é demasiadamente tentador para as pessoas da minha geração, que estão na faixa dos cinquenta e alguns anos, simplesmente bater o martelo com que somos privilegiados em relação à qualidade da oferta musical que tivemos desde a década de 1960 até a primeira metade, ou um pouquinho mais, da primeira dos anos 2000, em oposição aos tempos atuais. Entretanto, principal e inevitavelmente, com o advento da internet e do real-time, cada vez mais real, que disponibilizam mais e mais informações e opções aos interessados (tanto para os ouvintes, como também para os compositores, diante das facilidades tecnológicas e de baixo custo de gravação e/ou de registro amador). Quem pode dizer que conhece, pelo menos, boa parte da produção musical da atualidade? Acho pouco provável que haja muitas pessoas que possam desfrutar dessa condição, mas mesmo assim, muita gente boa afirma que a minha geração teve oferta incomparável de boa música, nacional e internacional. No fundo, concordo com isso, mas admito que não conheço nem 10% das produções musicais atuais. Ainda tenho muito a ouvir e a descobrir das músicas e dos clássicos antigos, especialmente na minha praia que é a MPB, e seus discos e artistas eternos.


Apesar de saber que os objetos artísticos também são itens comerciais, há muita coisa neles de subjetivo e emocional, e não poderia ser diferente. Mas quando comparamos produtos industriais, sejam eles alimentícios ou não, e a subjetividade sai de cena, substituída por critérios técnicos, infelizmente, muitos e muitos deles pioraram, num nível alarmante, a qualidade que ofereciam 40 ou 50 anos atrás: Sorvetes de potes de marcas muito famosas (e multinacionais), hoje em dia, são quase não comestíveis, e se você puser uma bola deles em cima da pia, por lá ficará sem derreter, tamanha a quantidade criminosa de gordura hidrogenada que usam na fabricação; barras de chocolates famosas, que fizeram parte da minha infância, perderam completamente a identidade e, agora, são massas decadentes e intragáveis de açúcar e de gordura; biscoitos tradicionais de marcas igualmente tradicionais estão completamente irreconhecíveis. Sem falar nos transgênicos. Parece que a gente tem cara de otário e, noves fora, a pilantragem explícita da indústria que diminui as quantidades das embalagens e mantêm os mesmos preços, em contas que jamais fecharão. Cambada de mafiosos inimputáveis. Cambada de autoridades omissas. Cambadas de cambadas.

Estamos imersos nesses tempos moderno-descartável-superficial-ultraprocessado-genérico-emburrecidos. E velocíssimos.


Sem nostalgia...


 

Cultura, literatura, artes, economia criativa e música

Como a Cedro Rosa Digital está inovando na música independente certificada?


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1 comentário

1 Comment


Guest
Oct 23, 2023

Esse texto é revelador. Expõe claramente a hipocrisia que existe na desenfreiada sociedade.

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