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SERRA



A subida da serra foi o seu maior encanto. E encantou-se, supreendentemente, ao volante. Nem gostava de dirigir, mas foi assim. A vista deslumbrante dos vales profundos e dos paredões rochosos, mais o perfil acinzentado da cidade ao longe, a vista dos patamares superiores da estrada, as paredes da serra recobertas pelo verde intenso da mata. Até a sinalização que alerta para o risco de neblina, a travessia de animais ou mesmo a possibilidade de rolamento de pedras. Tudo era poesia na subida, tudo era carinho na paisagem já praticamente decorada, mas sempre mutável. A árvore florida que se manifestava uma única vez no ano, as embaúbas douradas brilhando com o respingo das chuvas de verão. As mesmas chuvas que muitas vezes provocavam o fechamento da rodovia e a abstinência do prazer de subir. A neblina grossa do inverno, que impedia a visão e não era vencida nem mesmo pelos faróis de neblina. Os caminhões, carretas ou ônibus que obrigavam a uma fila atrás deles, subindo lentamente as escarpas das montanhas verdes.


O engenho humano. A capacidade de vencer obstáculos daquela maneira. Normalmente as estradas são desenhadas sobre caminhos anteriores existentes, trilhas desbravadas por viajantes do passado, que subiam e desciam a serra com suas mercadorias ou apenas em busca de locais mais seguros pra viver ou obter comida, caça, pesca, abrigo. Teriam também eles essa perspectiva estética? Provavelmente não. A montanha talvez fosse mais um desafio permanente a ser vencido, um obstáculo quase intransponível, mas obrigatório no caminho de um futuro possível.


Enquanto subia a serra, exercício semanal, pensava em coisas deste tipo. Os carros que usou ao longo dos anos, alugados, emprestados ou próprios, pareciam saber o caminho. Não havia qualquer esforço para guiar. A impressão era a de que eles, os carros, já sabiam onde deveriam acelerar ou reduzir. Mais ou menos potência do motor, limpadores de para-brisas, faróis de neblina, freio motor. Não sentia quando acionava cada uma dessas facilidades. Era como se já estivessem acionadas sempre. Eram componentes passivos de uma composição de cores e sensações idílicas, que levavam a um êxtase sensorial só interrompido com a chegada ao destino, no alto.


Uma vez lá, era como se tivesse atravessado um mar de prazeres espirituais, mas também carnais, orgiásticos, terrenos, o extremo dos gozos de um corpo insaciável em seu desejo de subir a montanha ao volante. Vontade que só seria saciada novamente na próxima subida, quando ela ocorresse. Previsivelmente, ocorreria na semana seguinte; mas, como sabido, uma grande chuva, por exemplo, poderia bloquear o acesso.


Acesso. Exato. Sua tônica nunca foi o final da viagem. Importava o acesso. A serra era o acesso, o caminho. E era aquela serra. Nenhuma outra. Sabia de outras possibilidades, outras subidas. Ali perto, poucos quilômetros a leste ou a oeste, ou a norte ou sul, nunca se importou muito com isso, havia alternativas de caminho. Mas não gostava de alternativas. Queria aquele caminho. Só aquela subida tinha os elementos, as vistas, as árvores, o tempo de duração, as placas, as curvas, os rios que o seduziam.


Foi um amor à primeira subida, justificada por um outro amor, um amor físico, carnal, humano, lá no alto.


Conheceram-se e amaram-se embaixo. Subiram juntos pela primeira vez, a primeira dele. Ele, um urbano comezinho, trivial, prosaico. Conhecia já uma parte do mundo, doces ossos do ofício. Conhecia montanhas mais altas, menos verdes, com neve, subidas muito mais difíceis. Mas nenhuma tinha aquela beleza. A beleza que via ao longe, olhando do Rio, mas que jamais tinha observado de perto, ao volante. Até que foi apresentado pelo amor gente, ao amor caminho, amor estrada, amor passagem, mas não passageiro.


Aqui um parêntese. Ela vivia no alto da serra. Tinha ido ao Rio pra um encontro com as amigas. Um fim de semana na praia. Não gostava de praia. Mas gostava das amigas. Enquanto elas se refestelavam com areia quente e água gelada, ela bebia uma caipirinha no quiosque. Ele chegou só. Vinha da água. Saquinho com os documentos, um cartão de crédito, o corpo de atleta e os pés cheios de areia. Nem bonito nem feio, como ela, também moça normal, sem beleza estonteante. Os sorrisos perfeitos se encontraram quando a cerveja dele, quente, derramou. Protesto, cerveja trocada, mais olhares trocados, brinde. As meninas não voltavam da água, novas caipirinhas, novas cervejas. Conversa fácil. Digitais, os dois. Ela consultora de segurança de dados, trabalhando em casa. Ele gestor de banco de dados, parte do tempo em casa, parte viajando Brasil e mundo afora.


Ela no alto da serra, ele a duas quadras da praia. Ela não gosta de praia, ele não tinha impressão sobre a serra. Não gostava particularmente de frio, mas sabia que bons agasalhos sempre resolveriam qualquer incômodo. Já conhecera invernos rigorosos.

Em duas semanas, ela desceu novamente por uma exigência imprevista do trabalho. E convidou-o a subir junto. Foram no carro dele. E deu-se a mágica.


Fim do parêntese.


A primeira ida. A vista embaça de emoção. As árvores que se sucedem nas margens da estrada sinuosa, as pedras que surgem nas curvas, a neblina densa que surge de repente e some causando a mesma surpresa. O verde, as vistas, mirantes de um infinito alcançável. Não teve nunca, na descida, o mesmo prazer. Importava subir. Não era importante o destino. Sempre a mesma cidade ao fim da subida. Bonita cidade, mas não querida. Querida era a serra.

O amor terreno, carnal, afetuoso, não eterno, foi infinito enquanto durou. Eram mais diferentes do que supunham ser. Ficou, no entanto, a vontade de subir a serra. Sempre.


Há outras serras, muitas, lindas. Buscou conhecê-las depois. Há montanhas pelo mundo todo, há subidas em toda parte. Mas nenhuma é como aquela.

Amores passam, amores vem e vão.


A serra é eterna.


Rio de Janeiro, outubro de 2023.


 

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