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TEMPO

Leo Viana, especial para CRIATIVOS!


Nada agoniava mais a Nati que a efemeridade das coisas. A curta duração da vida, naquela ótica inconformada, possivelmente era resultado de algum erro. Se humano ou divino, ainda havia o que descobrir, mas não podia ser acerto. Passando pelos quarenta anos, Nati vivia um casamento feliz e convencional. Tinha o casal de filhos com o qual sonhara desde menina, um marido amoroso e pai presente, uma carreira consolidada de psicóloga, atuando junto a grupos de trabalhadores de atividades de risco. Acostumara-se a atender mergulhadores de águas profundas, policiais militares, civis, funcionários de minas e refinarias, escaladores industriais, desses que limpam vidros externos de edifícios altos.


Confortavelmente instalada no consultório, com um tanto de competência técnica e um pouco de culpa, atendia aos seus pacientes e ouvia as mazelas da existência humana. Não sabia exatamente de onde vinha a culpa. Jamais fizera alguma coisa de que pudesse se arrepender ou que tivesse prejudicado qualquer pessoa. Mas ainda assim sentia, de quando em quando, um peso de culpa. Mas o que mais lhe bagunçava o humor era a pouca duração de tudo. Lembrava com detalhes das brincadeiras de infância e hoje já via os filhos tomarem as próprias decisões. Há pouco, em suas recordações, ela mesma não passava de uma garotinha que arrastava a boneca pra cima e pra baixo e que as vezes obrigava a pobre Barbie a ouvir horas de conselhos comportamentais. Não sabia se ali estava a origem do desejo de ser psicóloga, mas se envergonhava ao lembrar da qualidade dos conselhos, cheios de repressão e moralismo. Talvez por isso a boneca tenha desaparecido misteriosamente.


O fato é que tudo passava rápido demais. Os sessenta segundos do minuto precisavam ser mais. A duração do dia sempre foi insuficiente para a quantidade de coisas que Nati se planejava pra fazer. Sentia como se estivesse num grande intervalo comercial contínuo, mas dividido em pequenos filmes de 30 segundos. Em casa, comercial de margarina, com gente feliz em volta da mesa. No consultório, comercial de clínica de tratamento de disfunção erétil, onde há sempre ao menos um pessoa feliz e uma preocupada, que se “recupera” no final do filminho. Na rua, comercial de absorvente: uma mulher bonita andando leve e solta pelas calçadas enquanto todos olham pra ela.


Em comum, a curta duração, a efemeridade dos eventos. E essa sensação horrível de impermanência, de provisoriedade, uma vez que em pouco tempo tudo pode mudar muito.

Já não se sentia estimulada a voltar para casa ao final do dia de trabalho. Seria pouco tempo em casa, insuficiente pra atender às sempre urgentes demandas do filhos. E foi também pouco tempo no consultório, bem menos do que os dramas relatados exigiam de dedicação.

Em uma tarde da semana anterior, tinha parado num botequim para fazer uma refeição como nos tempos de criança.


Os olhos brilharam diante do bife com salada. O prato pareceu transportá-la a um tempo de menos pressa, em que o dia parecia durar mais e em que os quase infinitos intervalos entre os fins de semana levavam a uma impaciência dramatica. Hoje, os domingos parecem emendados uns aos outros, com rápidas brechas onde se vive o trabalho e o mais que evitamos fazer no fim da semana. O marido começava a suspeitar que aquilo poderia fazer mal à Nati. A inconformidade dela com o tempo começa a atingir outras áreas da vida e tornar a convivência difícil. Acelerava ainda mais a rotina, em busca de um tempo perdido que não poderia mais ser recuperado. E a trilha sonora parecia ser um samba enredo acelerado desses recentes. Ou música eletrônica, com muitos pulsos por minuto. A correria era tamanha que Nati passou a ser abordada nas ruas e calçadas por pessoas desconhecidas, preocupadas sempre com a velocidade na qual andava, quase sempre atropelando pessoas, canteiros, animais, barracas de ambulantes, carrinhos de bebê.


Neste momento, curiosamente, parecia mais calma. Terminara o relato de suas próprias mazelas para a psiquiatra que filhos e marido acionaram pra impedir o colapso.

Disse tudo, falou praticamente sozinha por quase duas horas sobre sua preocupação com o tempo.


- De repente, tá o mar subindo, tá o mundo esquentando, as crianças crescem, tá a finitude das coisas mais presente que nunca.


A Dra. Lu, especialista nos transtornos de ansiedade, ouviu cuidadosamente o caso, fez anotações, pensou muito na literatura específica, ofereceu à Nati um ansiolítico de emergência, motivo da sensação de um pouco menos de tensão, mas tomou uma decisão em seguida: tomaria também ela, um ansiolítico. A Nati estava certa desde o início.


Já é dezembro!! É tudo muito rápido!!!


Rio de Janeiro, dezembro de 2023.


 

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