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Foto do escritorPaulo Castro

Da Antiga



Abriu a porta para que ela passasse, dizendo: "Tenha a bondade". A jovem respondeu gentilmente, com um sorriso: "Obrigada". E logo completou, perguntando e, ao mesmo tempo, afirmando: "O senhor é "da antiga", né?˜. Entrou também na loja, mas seu pensamento não estava mais no que ia comprar, e, sim, na expressão com que ela o qualificou. Não foi agressiva, pelo contrário: o ˜da antiga˜ soou respeitosa e carinhosamente. Pela idade dela, no máximo uns 25 anos, devia ter ouvido de algum familiar mais velho ou, quem sabe, do samba do Nei Lopes. Pouco provável, mas não impossível. Comprou o de que precisava, procurou pela moça, para matar a curiosidade, mas não a encontrou mais.


Na rua, indo pra casa, teve como companhia a expressão adjetiva. Será que ela realmente combinava com o seu perfil, com suas atitudes? Seria ele realmente ˜da antiga˜? Ser ou não ser: eis a questão! Nada ameaçador nem depreciativo, mas merecia esclarecimento. Ela, a moça, sem querer, colocou uma questão no seu dia.


Desviou-se do seu caminho e dirigiu-se para a esquina, ou melhor, para o bar da esquina, ao encontro da turma. Depois de algumas piadas, causos e chopes, falou do encontro e da expressão usada por ela, gentilmente, fez questão de dizer.


Os amigos ouviram em silêncio e, pelo que conheciam dele, alguns com amizade de mais de 50 anos, concordaram com ela. E mais: reconheceram que, na verdade, a adjetivação se aplicava a todos do grupo, e que, realmente, usavam, vez ou outra, sem querer ou querendo, palavras datadas da época deles. O foco, hoje, porém, era a expressão ˜da antiga˜. Colocou o tema na mesa, discorreu um pouco sobre ela, passou a bola e, enquanto ouvia as histórias e opiniões, entremeadas de gozações, pensava que não eram só as palavras que compunham o seu perfil: a sua história também.


Sobre Copacabana, gostava de lembrar do Cassino Atlântico, do Beco da Fome; do futebol de areia, do Juventus, do Radar, do Lá Vai bola...; das turmas de rua, da Paula Freitas, da Miguel Lemos, da Barão de Ipanema e das brigas entre seus integrantes, na mão; das moças que passavam "cheias de graça"...


No futebol, falava com amor do seu time, o Fluminense de Castilho, Píndaro e Pinheiro... Permitia-se uma exceção fora do clube: Garrincha, um ˜gênio!˜; Copa do Mundo, a seleção era a de 58. Usava o termo ˜Esquadrão Canarinho˜ e se referia a Pelé sempre como o ˜Rei do Futebol˜. Não cansava, pois trazia sempre histórias pouco lembradas sobre os atletas e bastidores., tudo com muito humor.


Quando o papo era cinema, buscava na memória Rian, Caruso, Flórida, Ricamar, Alvorada, Metro Copacabana, Pagador de Promessas, Terra em Transe, Boca de Ouro, Os Fuzis, Blow Up, Psicose, Acossado, Oito e Meio... Obras Primas, dizia.


Em política, eleitor do "Velho Briza", defendia com entusiasmo os Ciep’s e lamentava seu abandono. `Lugar de criança é na escola˜, afirmava Darcy Ribeiro, que, na sua opinião, era um "Mestre".


E assim, depois de vários chopes, risadas e causos, chegou a hora da despedida. Ergueu o copo e disse: Amigos, "vou levantar acampamento, até à vista!"


Alguém respondeu: "Tenha a bondade!". Gargalhada geral.


Voltou para casa, feliz: era da antiga, sim, mas não estava sozinho.


 

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