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A Ditadura do Produto Industrial


Eleonora Duvivier foto: Chris Dodds


Grande parte da sedução da indústria tem a ver com os ritos que cria em torno de seus produtos. Não é atoa que Steve Jobs não só queria que houvesse beleza além da utilidade em tudo que a Apple produzia, como intencionava que cada um de seus produtos fosse, a partir da abertura de sua embalagem, uma “experiencia” para o consumidor. Com prazer, podemos sentir a suavidade da caixinha do iPhone na nossa mão e a fluidez da sua superfície, antes de rompê-la e alcançar seu conteúdo. Embalagens são como as molduras de um quadro, podendo valorizar ou diminuir o objeto que contém. Aumentam a poluição de lixo no planeta, mas cantam hinos aos seus produtos como se introduzissem a “alma” deles.


Alma?


Isso me lembra o que disse Camille Paglia sobre a qualidade pagã da civilização ocidental que na verdade só adora mesmo o objeto industrial. Só que o charme ou a eficiência de qualquer um desses objetos vem cada vez mais se transformando em tirania, e a adoração pagã que lhes corresponde se tornando cega escravidão. As embalagens, como cintos de castidade, estão cada vez mais difíceis de abrir a ponto de existir ferramentas com ramificações múltiplas para cortar, desatarraxar, ou desatar o produto de dentro delas. Nesse sentido, a etiqueta “Try me” (experimente-me) colada sobre as amostras dos produtos competindo entre si nas prateleiras das lojas, deveria mudar para “rape me” (violente-me) para aludir à dificuldade de alcançar os produtos representados por aquelas amostras, quando o alívio de finalmente conseguir tocá-los corresponderia ao orgasmo do consumidor.


Afora isso, dentro das tais embalagens, os livretes de instruções sobre como usar o que embalam, que já são super sacais e muitas vezes redundantes (e tão extensivamente explicativas que chegam a confundir) vem sendo acompanhados de mais e mais folhetos, tipo explicações sobre a manutenção do produto, garantias, e em alguns casos, mais folhas de papel explicando como descartá-lo adequadamente.


Por causa de todo esse estresse, num certo Natal, eu realmente aplaudi meu enteado, que sempre foi um cara sarado que só pensava em aumentar seus músculos, e tinha recebido de sua avó um invólucro de plástico transparente contendo uma nota de cinquenta dólares. Para essa nota ser alcançada, ele deveria manipular uma certa bolinha ali dentro do involucro através de botões na superfície deste, até que essa bolinha atingisse um determinado alvo e assim o tal invólucro se abriria para libertar a nota que continha. A ingênua avó pensava ter sido espirituosa ao arranjar um jeito lúdico de presentear o neto com cinquenta dólares. Mas o cara, representando a força cega sobre qualquer “espirituosidade”, simplesmente deu um puta soco naquela baboseira, quebrou-a em muitos pedaços e se apossou da nota.


Muitas vezes em que me debato com alguma embalagem, me lembro disso, e se tivesse aqueles músculos, também a destruiria.


A tirania da matéria se escarnece de qualquer experiencia ritualística, anula a possibilidade da “alma” no produto, e pede mesmo um bom sopapo na cara!


 

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