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Foto do escritorMarlos Degani

STARMAN



Havia um roxo estranho nas pálpebras da manhãzinha acordei de supetão com o frio glacial dos 16ºC na Baixada vento de orla sudoeste sem orla do morro ardósia entremeado com âmbares secos que de longe parecem úmidos e na TV passou a Rua da Derrapa no Méier onde caminhão da COMLURB deslizou feito pedra de gelo na ladeira de paralelepípedo e parou no muro do centro espírita o acaso pode ser estranho e logo em seguida o dia toma uma proporção musical aquele em que você é visitado por várias canções da playlist inusitada que continua nesse pedaço de inverno no carro da minha irmã toca Sonho de Ícaro e lembro de outras canções que adoro do Biafra Seu Nome Helena Leão Ferido depois tocou Taiguara eu preciso de você ai eu preciso muito de você David Bowie there´s starman waiting in the sky as horas retrocedem ao passado longínquo tipo VHS da coleção de cinema do Jornal O Globo nos anos 90 que saía aos domingos numa seleção incrível de 17 filmes memoráveis Don Juan de Marco Perdas e Danos A Casa dos Espíritos Lua de Fel entre outros mais o magnífico Cortina de Fumaça com Harvey Keitel e Willian Hurt película que mudou a minha vida há poucos meses morreu Paul Auster autor do romance que deu origem ao longa ele dizia que a produção ideal era a de uma página por dia e que uma página bem escrita por dia dava muito trabalho raramente penso que posso entender como funciona a cabeça dos artistas da minha convivência pessoal ou não via admiração de suas obras até mesmo através da vida toda a arte é resumo de séries de circunstâncias imensuráveis de projeções caóticas conceitos caminhos ainda sem sentido para o próprio artista quando resolve transformar esse mosaico mental num objeto artístico seja ele qual for e objeto tem de ser tratado como objeto mutável aos olhos de quem vê trabalhado para ser um bom objeto afinal de contas e cumprir sua missão de deslocar-nos do nosso lugar de costume para o bem ou para o mal ou para inveja ou para qualquer situação diferente da masmorra da rotina a qual estamos presos enjaulados sem luz do sol muito trabalho para fazer um prato delicioso a arte é o sal pouca mas necessariamente essencial ao sabor é gota de orvalho na sede a fim de que não se morra feito nuvem que o vento leva precipitada na fresca brilhante da madrugada já estou sentado na cadeira elétrica dos ofícios assinando ofícios sem alma no mouse da morte das planilhas no desfiladeiro das ordens de serviços lá fora é terça pedindo para ser escrita o diário silencioso dos signos da poesia no pé do bueiro ou no minuano que condensa o suor da careca no pátio e do mirrole que apaga constantemente sinto o cheiro pandêmico do alho são onze e quatro balanço as minhas pernas sobre o carpete fechad