SAUDADE
- Leo Viana
- 20 de jul.
- 6 min de leitura

Querida!
Quanto tempo, hein? Como você me faz falta... Nem sabe!!
Já não lembro se te escrevi no século passado ou no anterior. É coisa demais pra contar e a mente da gente embola, né? Desde que você se mandou, naquela encrenca com a família real... Foi Pedro I, aquele que era meio galinha, não foi? Mas você também era da pá virada! Eu adorava aquela confusão que você armava em São Cristóvão toda vez que ele dava em cima de você. Ameaçava contar pra Leopoldina, pra Domitila e pra mais uma meia dúzia de amantes que ele tinha. Hahahaha! Você era sem freio mesmo!!
Mas querida, como você está? De lá pra cá aconteceu coisa demais. Acho que você nem imagina. Você não viu nem a república aqui, né? Ih... Foi um bololô danado. Lembra que Pedro I entregou o império pro filho, né? E foi promovido a Pedro IV em Portugal. O filho passou pra história como mais velho que o pai, porque envelheceu reinando aqui e é cheio de foto, coisa que o pai não teve. Isso confunde demais as crianças na escola. Mas quando o Pedro II tava já mais pra lá do que pra cá, sofreu um golpe militar que deu na república. A república ia acabar acontecendo, mas o exército daqui já avisou que queria ser o pai da criança. De lá pra cá aconteceu de quase tudo. Pouco antes, em 1888, mas depois de muita luta, aboliram a escravidão, aquela página infeliz da nossa história.Aliás , página, não. Aquilo equivale a vários capítulos!! Em 1889 veio a república. E o desenvolvimento dessa parte fica melhor contado em samba enredo, mas posso te dizer que foi uma sequência de empresários, militares, fazendeiros. Quase sempre. E de tempos em tempos rolava um golpe, uma ditadurazinha. Coisa louca mesmo.
Tô ficando chata, né? Mas leia tudo com calma. Pode parar pra fazer as tuas coisas e voltar depois. Eu também me perco aqui na linha do tempo, mas quero te dizer o máximo. Assim as outras cartas podem ser menores... A Dircinha – lembra dela?? - tá super bem. Mandou um beijão.
Então, até 1930 foi mais ou menos isso. O mundo pegou fogo com a guerra de 14-18. Morreu gente como nunca na Europa. Mais que na peste. Da peste você lembra, não é? Mas a gente ficou tranquilo aqui. Nem respingou muito. O Santos Dumont, um menino mineiro que inventou o avião na França, foi o brasileiro que mais sofreu, com o uso da máquina dele pra matar gente. Triste isso, coitado. Acabou até se matando uns anos depois. Mas enfim, o avião também serviu pra muita coisa boa e agora a gente cruza o mundo pra lá e pra cá em pouco tempo, uma beleza.
Mas tô me atropelando, pera aí. Tem coisa a beça pra te dizer.
Em 1930, depois de alguma encrenca, assumiu o Getúlio Vargas, um gaúcho baixinho e decidido. Queria porque queria “desenvolver” o Brasil. Mas se enrolou. Acabou criando o tal do “Estado Novo”, que era uma autocracia meio estranha e se aliou a gente esquisita. Pra azar dele – e de nós todos – a Alemanha começou outra guerra e essa foi muito pior e mais violenta. Vargas teve que mandar soldados pra lá pra lutar contra a Alemanha, resultado de um acordo com os Estados Unidos e do ataque alemão a uns navios brasileiros. Não fizemos feio, mas perdemos um monte de garotos que podiam fazer coisas mais legais aqui no Brasil. O mundo acabou dividido ao meio e os Estados Unidos ainda jogaram duas bombas atômicas no Japão, matando um monte de inocentes. Os militares japoneses eram osso duro de roer, mas os civis não tinham nada com isso. Ah, esqueci de pelo menos duas coisas. 1) A Revolução Russa, de 1917, que implantou o comunismo e criou a URSS, um tipo de “Estados Unidos do Comunismo” e 2) O nazismo. O Hitler, um frustrado, recalcado, desgraçado, a pior alma do século 20 e uma das piores de todos os tempos, assumiu o poder numa Alemanha detonada pela primeira guerra, que já tinha sido provocada em parte pelos delírios deles mesmo, e iniciou um projeto enlouquecido de purificação de seu povo, que passava pelo extermínio dos judeus. E pela obtenção de um espaço maior pra Alemanha. Enfim, pra isso promoveu um holocausto, o assassinato em escala industrial. Foi assustador demais, porque o mundo custou a descobrir. Não fossem os russos e os americanos que, mesmo em campos opostos, entraram em cooperação , estaríamos provavelmente falando alemão. Isso se a gente ainda existísse. Nós, os não arianos...
Mas voltando, pra cá... Tá cansativo, né?
Depois, o Getúlio fez umas coisas boas, organizou o trabalho, melhorou a educação, etc, mas foi sucedido pelo Dutra, que era o ministro da guerra dele, mas tava brigado, apesar de terem saído da guerra com o cartaz alto. Depois Gegê voltou nos braços do povo, mas acabou também se matando em 24/08/54, depois de muita conspiração contra ele. Dai pra frente a coisa foi bem complicada. O Juscelino ficou obcecado com o negócio de fazer Brasília. Fez e levou a capital pra lá, mas os primeiros anos foram só a renúncia do Jânio, o Jango tentando priorizar quem mais precisava e logo o golpe. Não vou detalhar muito, pra não te entediar mais ainda, mas foi um horror. O Brasil ficou esquisitíssimo. Sobraram a música e o futebol. Muita morte, tortura. Onde entra militar aqui, já viu, né? No mundo, ainda teve mais um monte de guerra. Coréia, Vietnam, Israel com os vizinhos, Irã e Iraque, Rússia com o Afeganistão, as guerras de independência dos países da África. O mundo não aprendeu nada. Até a Argentina desafiou a Inglaterra. Uma merda. E isso tudo na sombra da tal da guerra fria, que começou quando acabou a carnificina da segunda guerra.
Eu tô muito cansada, muito velha, você sabe. Você também deve estar né? O século XX acabou com o desenvolvimento da tal da internet. Se vc tiver um provedor aí, a história do XXI até aqui eu nem preciso te contar. Me diz. Tem tudo lá quase ao vivo.
Só vou te antecipar que o comportamento dos dirigentes do estado de Israel com os palestinos é parecido demais com o dos alemães com os judeus; que o apartheid acabou, finalmente; que no início do século o Brasil finalmente elegeu um cara “não hegemônico”, o Lula, que tinha sido presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo do Campo, fundou um partido de esquerda e fez dois governos incríveis. Depois elegeu a sucessora, a direita deu um golpe na reeleição dela e foi tudo ladeira abaixo de novo, até chegar o fundo do poço com um miliciano, corrupto, covarde, mentiroso e ladrão disfarçado de conservador, o que já seria um defeito em si. Eu tenho mais de 200 anos e se me chamarem de conservadora, eu xingo até a 5ª geração! E olha que eu conheci umas seis ou sete anteriores desse pessoal que tá aí...
A melhor notícia é que ele tá encalacrado até os ossos e dia desses puseram uma tornozeleira no bicho. Que prendam logo!! Ele e a família toda. E tem um careca brabo e poderoso aqui que encara mesmo! Teria sido um grande amigo nosso naquele tempo!!
Ah, pela internet você talvez não entenda que a China é uma potência enorme, que os americanos bloqueiam Cuba, uma ilhazinha praticamente inofensiva e que o mundo tá meio acabando, com as tais das mudanças climáticas.
Não acho bom que você venha visitar a gente. O Sandoval morreu tem uns cem anos. Sempre me confundo com a data. Ele sempre lembrava de você, mas morreu cedo, o coitado. Nem 150 anos ele tinha. Era um pouco mais velho que eu. Mas desafiou um Papa e puseram fogo nele. Bem depois da inquisição, mas... Meus filhos se mandaram também. Às vezes vêm pra me ver, mas não muito. Se você vier, eu aviso a eles, mas não recomendo mesmo.
Por último, tem uma tal de inteligência artificial, que eu não entendi ainda, mas me disseram que ela é capaz de fazer quase tudo que a gente faz. De repente até escrever pra você, se eu não conseguir mais.
Um beijão, meu amor. Eu tô aqui lembrando de como a gente podia ter sido feliz juntas, se você não tivesse decidido ir vagar pelo espaço quando conheceu aquele pessoal. E isso de a gente ser imortal deixa a saudade imortal também. Mas no fundo eu fui feliz e você também foi. Agora é ver a eternidade passar.
Tchau, bruxa. Espero que a carta chegue.
Mandei uns links de rock’n’roll, jazz, música brasileira e uns filmes. Olha aí e comenta.
Mande notícias.
Da sempre sua
Morgana.
Rio de Janeiro, julho de 2025.
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