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DESFILE



A vida, de uma hora pra outra, parecia ter resolvido cobrar por todos os excessos dos anos anteriores.


Foi essa a sensação que o corpo da Marlizinha transmitiu para a mente naquela manhã. Dores lancinantes, cansaço mortal. Pela cabeça passavam as bebedeiras exageradas do tempo de estudante, os carnavais, réveillons, feriados diversos de infinitas noites mal ou não dormidas, as viagens, físicas ou não, com ou sem deslocamento efetivo, com turmas, meios de transporte e substâncias igualmente variadas.


Por um instante, vinham como um filme os esforços exagerados pelo trabalho, o tanto que sacrificou alimentação, família, lazer. Tudo pela busca de reconhecimento profissional e de uma velhice confortável, num futuro incerto e distante.


De olhos fechados, com o corpo enviando a ela o que de certo seriam os sinais de seus últimos momentos, assistia à projeção mental de tudo o que julgava ter feito errado, considerando o peso que lhe oprimia agora, o tanto que tinha perdido em bons momentos apostando num ponto futuro que continuava distante. E que agora, aparentemente, tinha muito menos chance de materialização. Era o fim.


Mas a transmissão, em altíssima qualidade, não parava. Vinham a ela, como num “beija mão” final, os falsos amigos acumulados ao longo de sua até aqui bem sucedida carreira. Um de cada vez, desfilavam sorrisos falsos e cumprimentos sarcásticos. Marlizinha sempre foi forte no trabalho, não se abalava. No filme imaginário, cumprimentava a um por um, desejando sorte. Vieram também os amigos reais, que a acompanharam nos melhores e nos piores momentos, namorados antigos, filhos, família.


A nitidez e a complexidade da construção mental assustavam até a ela mesma, mas eram o fruto de uma mente acostumada a lidar com dados não sistematizados, situações imprevistas, a organizar coisas que a maioria dos mortais não saberia sequer identificar.


E a super série continuava. Tios antigos, do interior, que além de falecidos há muito tempo, não eram a melhor experiência da vida, porque tentaram a todo custo disciplinar a pequena Marlizinha no tempo em que passava as férias com os primos e primas da roça. Eles também desfilaram naquele que parecia um cortejo de despedida, a velha história de que a vida se exibe inteira em sua frente quando você está prestes a deixá-la.


A praia! A praia tinha sido o seu cenário favorito. Era lá que refletia sozinha, nas poucas vezes em que resolvia refletir. Sempre foi mais impulsiva que reflexiva, mas sol, areia e água salgada foram componentes decisivos nas decisões importantes, para o bem e para o mal. Assim, o cenário onde essa procissão se desenrolava era à beira mar. Personagens improváveis naquele lugar, como o primeiro chefe ou a mãe chatíssima do segundo namorado, que implicava com o cabelo curto da Marli. “Parece um menino”, repetia. E que chegou a colocar um bilhete na mochila da então estudante do secundário, ameaçando-a se não deixasse o filhinho dela. Marli seguiu namorando escondido o garoto por mais de um ano, até que ele, para desgosto ainda maior da mãe, trocou a Marli sapeca por um outro menino. E vive feliz até hoje.


O desfile variava entre parada, procissão e passeata, com momentos carnavalescos, como foi a chegada das amigas fiéis, com quem Marli compunha uma espécie de confraria dedicada à alegria. Verdade que sofreram juntas, fizeram planos mirabolantes, desfilaram em escolas de samba, acamparam, colecionaram histórias bem e mal resolvidas com homens, mulheres, empregos, projetos. O que nunca variou foi a intensidade que marca as grandes amizades.


A proximidade dos cinquenta anos e o fato de todas agora já viverem relações mais ou menos estáveis, com filhos e outros lastros, não as afastou umas das outras. Mas passavam ali como para ver a Marli de longe, com acenos distantes. Eram as mesmas, felizes e sorridentes, amigas de verdade, mas a uma distância que tornava a cena estranha para a mente da Marli.

De repente deu-se um branco total. Toda a multidão que desfilava, as crianças que faziam algazarra, os variados estratos da vida da Marli, que rodavam em looping, permitindo que diversas fases se sobrepusessem, criando complexidades ainda maiores, associando acontecimentos ocorridos com muitos anos de intervalo, traumas de infância com eventos recentes, brincadeiras do passado com decisões cruciais da vida adulta, tudo aquilo desapareceu. Para a mente hiperconectada da Marli, parecia a hora final, o momento em que tudo se desliga e a vida se esvai definitivamente.


Acordou cercada de gente de branco. Nunca imaginou que o céu efetivamente existisse.

- A senhora pode ir pra casa, disse um dos médicos.

- Como assim? Perguntou a Marli.

- A senhora tem uma gripe, que provocou essa dor no corpo e a febre. Além disso teve uma queda de pressão, o que a fez desmaiar. Mas está medicada, fizemos diversos exames e não há motivo para preocupação. Pode ir tranquila.


Na porta do hospital, duas amigas e o filho caçula a esperavam. Abraços, beijos. Uma das amigas, entre gargalhadas, falou: Você sempre foi fraca pra dor!!

Por via das dúvidas, vai esperar o fim dos remédios pra abrir uma cerveja. E talvez escrever um roteiro. Porque não? O filme ela já até assistiu...


Riu sozinha.



Rio de Janeiro, outubro de 2023.


 

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