Cidades Inventadas e uma pequena homenagem a Marceu Vieira
- Jorge Cardozo 
- 7 de out.
- 2 min de leitura

Alguns de nós, privilegiados eu creio, habitam cidades, senão feitas de sonhos, pelo menos por eles contaminadas. A substância etérea do sonho, inflamada pela imaginação, impregna-se nas ruas, nas esquinas, nas calçadas, nas construções. De tal forma que a concretude típica das aglomerações urbanas perde um tanto de sua rigidez, misturada a sentimentos e sensações acumuladas em anos de convivência.
Pensei nisso quando soube da partida prematura do jornalista, poeta e compositor Marceu Vieira. E estas mal traçadas vão tomando forma de texto ainda sob o impacto de tão grande perda.
Entre as tantas homenagens póstumas publicadas nas redes sociais por amigos, parceiros e admiradores do Marceu, uma me chamou a atenção (peço desculpas por fugir agora o nome de quem postou): dizia, em outras palavras, que o talentoso jornalista fez de Morro Agudo a sua Makondo.
Uma referência à mítica cidade onde se passam os fabulosos acontecimentos de Cem Anos de Solidão, livro icônico do escritor colombiano Gabriel Garcia Marques, um dos maiores nomes da literatura latino-americana.
Morro Agudo, para quem não conhece, é um bairro quase cidade no município de Nova Iguaçu, Baixada Fluminense, Estado do Rio de Janeiro, Brasil. Um visitante que lá chegue desavisado, provavelmente não irá perceber os detalhes que fazem do local oficialmente denominado Comendador Soares, um pedaço de chão que se torna muito mais que isso, ao reunir gentes e ideias graves e agudas.
Gentes que reinventam relações entre arte e juventude, entre culturas e educação, entre praças e poesia. Gentes feito o poeta Totó, o rapper Dudu – do Movimento Enraizados, a cantora Lisa, o artista Átomo, o diretor da Escola de Música Brasileirinho – Décio do Cavaco. E de muito, muito mais.
No livro Cidades Invisíveis, Ítalo Calvino descreve urbanidades fantásticas, fazendo do sonho a substância da memória que pode contar histórias para muito além dos meros fatos e construções do percurso histórico, através da fala do personagem (real?) Marco Polo, o viajante veneziano que levou os encantos do oriente para a Europa do fim da Idade Média.
Em Morro Agudo, do Marceu e de tantos, na Shangri-Lá, deste que vos fala, na Miguel Couto do Paulinho Silva, do Galante e de outros, na Piedade do Molica (onde o céu tem elefantes), nos grandes sertões e veredas dos brasis e das periferias, as cidades – ainda que invisíveis – são mesmo é inventadas.
Jorge Cardozo
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Escute a música BAIXADÃO, de Tuninho Galante e Marceu Vieira
com o Grupo Dobrando a Esquina.
O Valor Invisível da Música
Por trás de cada canção existe uma rede de profissionais. Muitos não aparecem no palco, mas são essenciais para que a arte chegue até nós. A Cedro Rosa Digital organiza esses direitos e dá voz a quem antes era invisível.



















Desde que li Cem Anos...Mesquita e Nova Iguaçu sempre foram minha Macondo. O Brasil é uma Macondo. Com seus personagens, o mágico Melquiades aparecendo de vez em quando nos circos que por lá vinham de vez em quando, ciganos, as gerações que se sucediam na contação da História...os Buendia...Ursula resistindo a tudo...
Texto Espetacular!
A riqueza de atuação e vida do homenageado refletiu diretamente no bairro-cidade Morro Agudo, em outros cidadãos ilustres da Baixada revisitando “Macondo”; quanta riqueza e um transbordamento de alusões num texto de qualidade ímpar. Certamente Marceu Vieira é merecedor desta página que entrelaça o sentimento de saudade e respeito com uma amplitude cultural grandiosa, através de uma habilidade profícua do autor.
Bom de ler e apreciar!