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Sobre os relacionamentos atuais...


Joana Machado Valladares Padua

Percebemos hoje uma grande quantidade de pessoas que não se relacionam bem, ou que têm muitas dificuldades em suas conexões afetivas. Isso se dá por uma ilusão de que existem inúmeras opções. É a idealização vinda da era digital que nos leva a acreditar existirem infinitas possibilidades. Parece sempre quererem mais, ou desejarem algo que não têm. Assim, surgem vazios existenciais ligados à insatisfação, incompletude, frustração, e a tendência é projetar nos outros o desejo de uma felicidade inalcançável, que deveria partir de si próprio.

Essa é uma das características narcísicas do “venha a mim”, esperando que o outro proveja, conquiste e supra as infindáveis necessidades que residem na pessoa. O pensamento é permeado pelo dilema de: “se o outro me merece”; “se é bom o suficiente para mim”. Paira uma dúvida de haver sempre alguém melhor à espera, mais apto, e com isso não há compromisso de construir boas relações, que passam a ser descartáveis. Nessa vibe, pode acontecer de nem se reconhecer alguém que possa ser bom/boa companheiro(a) e nem perceber que poderia haver encaixe nas expectativas do que se diz querer.

O crucial é que falta autorreflexão, um olhar sobre o que é preciso curar, aprimorar e tratar em si mesmo para que haja a possibilidade de oferecer o que se têm de melhor, e não apenas exigir. Falta entendimento sobre a necessidade de olhar para dentro, assumir a própria responsabilidade e reconhecer o que agrega para construir uma relação saudável. A grande reflexão deveria ser sobre como as próprias inseguranças pessoais interferem no relacionamento e, assim, se deixa de buscar formas de tratá-las.

Quando as relações se baseiam apenas nas aparências e nas expectativas, as demandas aumentam e podem ser insaciáveis. Pautar os valores e a autoestima apenas em aspectos superficiais ou sexuais é depreciativo e frágil. As chances são grandes de se atrair pessoas com fragilidades e não interessadas, ou até mesmo impossibilitadas emocionalmente, em se dedicar a construir algo saudável. Esse ciclo tende a ser bem solitário, mesmo quando se está com alguém.

Há uma aparente falta de vontade em investir em uma conexão significativa, por conseguir os benefícios de suas necessidades superficiais sem esforço, ou ter validação externa acreditando ser suficiente, sem ter que buscar e se empenhar na mudança e transformação mais profunda interna que leva a uma relação de comprometimento e de crescimento mútuo.

Encontrar algo significativo e mais profundo, baseado em uma conexão real e com comunicação clara, requer empenho e cooperação. São essas as relações que tendem a ser mais duradouras e de crescimento mútuo. Mas essa é uma escolha individual. Não existe perfeição. Não existe alguém que tenha absolutamente tudo o que se deseja. Todo mundo tem defeitos e bagagens mal resolvidas.

O ideal, caso queira se relacionar, é ter alguém ao seu lado com quem se sinta à vontade de ser quem você é (e vice-versa). Que possa rir em momentos de diversão com leveza. O ideal é que você atraia alguém que não seja a continuação dos seus traumas de infância. Alguém que tenha reciprocidade, que consiga ser acolhedor nos momentos desafiantes. Alguém com quem tenha verdadeira intimidade, com quem sinta lealdade, respeito e confiança. Alguém que entenda e aceite você e que te permita ser recíproco e natural. Alguém com quem consiga construir projetos futuros, que queira pensar e falar sobre o que está por vir. Alguém com quem você possa ter trocas de qualidade, que cuide e se importe com o que é caro a você. Alguém que irá colocar as suas necessidades como tão importantes quanto as próprias, porque é aí que acontece comunicação, negociação e disposição de ajustar interesses e diferenças. Assim, as chances aumentam quando há um impasse, de conseguirem buscar juntos uma solução que seja prioridade para ambos.

A falta de momentos de conexão ou de cuidado com a emoção do parceiro pode levar a grandes questões relacionais. Quando um expressa ao outro que algo é importante ou que há uma necessidade a ser suprida, ou até mesmo quando faz um desabafo sobre como o dia foi difícil por algum motivo, se a resposta for silêncio e desinteresse a relação se fragiliza. O mesmo ocorre quando ao invés de uma escuta presente e acolhimento necessário, a reação vem de forma agressiva e defensiva, jogando a culpa na outra pessoa. Ter conexão e interesse no outro em pequenas (e grandes) situações gera segurança e confiança, que é o que fortalece relacionamentos o os fazem durar mais. É um cuidado constante com a necessidade emocional do outro.

Uma relação saudável tem como sinônimo querer o bem da outra pessoa. É uma parceria de troca, na qual um se importa com os sentimentos e com o bem-estar do outro. É uma busca contínua por cooperação e crescimento conjunto e não o contrário.

Se ao expressar sua necessidade emocional, a outra pessoa entra em estado de competição, crítica e ataque, projetando culpa no parceiro e negligenciando a própria responsabilidade na relação, vai gerar cada vez mais desconexão e sofrimento. Essas são pessoas que tendem nutrir relacionamentos com atitudes que atiçam e provocam vulnerabilidades. Ferem os sentimentos do outro propositalmente. Querem ter controle e poder, com “autonomia” em ganhos ilusórios, alimentando disputas que nem deveriam existir.

Cooperar é também reconhecer das suas próprias limitações. É saber o quanto de energia, paciência e gentileza podem ser investidas em momentos que se percebe não estar bem. Idealmente, os momentos desafiantes que a vida apresenta deveriam servir para fortalecer a construção de relações sólidas. É quando a confiança e o apoio podem emergir e aí juntos conseguem se ajudar em uma troca recíproca e respeitosa.

Seja você a sua melhor versão. Isso significa excluir quem não vale a pena e ousar se abrir para o que tem potencial real em um mundo tão superficial.


Joana Machado Valladares Padua para o portal CRIATIVOS!

 

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