Apesar dos pesares
Conhecendo meu espaço como já conheço, tenho que admitir que surpresas são raras quando o assunto trata das manifestações espontâneas da natureza. Esta frase carrega um engano lamentável, inserida de pretensa auto-suficiência e empáfia que não coaduna com quem vive no interior, onde nós, seres humanos somos parte e não senhores.
Nossa inteligência (eu disse inteligência?) cartesiana nos ludibria tornando ridícula qualquer tentativa de domínio dos movimentos naturais e do fluxo dos deslocamentos dos eventos e ocorrências características do nosso planeta. Achamos, estupidamente, que controlamos os processos da física e da química que desencadeiam nos acontecimentos que, como mostra a realidade, resultam nas hecatombes que vemos mundo afora. Sejam temporais, inundações, quedas de barreiras, incêndios, ventos anormais, tsunamis, furacões, secas, desequilíbrios ambientais, pandemias, devastações, derretimento das calotas polares, super El Niño ou La Niña, tempestades de areia, dilúvios em pleno deserto de Saara, poluição do ar e do mar, microplásticos envenenando a vida marinha, temperaturas que se elevam, mercúrio poluindo rios, a lista é enorme ... e nós, imbecis que somos, nos achando superiores.
O ser humano se dissociou da Natureza. Acreditou burramente que não fazemos parte do natural. Usamos a natureza para nosso uso exclusivo e egoísta. Não bastaram os inúmeros alertas da ciência, a ganância falou mais alto. Os resultados estão sendo vistos a cada dia pela TV.
As grandes cidades são aberrações. Depois de uma chuva inexistem locais por onde as águas possam escoar e penetrar de volta ao solo. O consumo desenfreado de toda e qualquer matéria-prima só piora a situação planetária. Mas a cobiça é mais urgente. E assim caminha a humanidade... O carro elétrico não polui mas as minas para para a captação dos materiais para suas baterias acaba sendo mais poluentes e emitem mais CO2 do que os carros a combustão.
As hidrelétricas – apesar da energia dita “limpa” – inundam áreas imensas, deslocam populações ribeirinhas, destroem vegetação natural, causam assoreamento do leito dos rios, causam desmoronamento de barreiras, extinção de peixes, causando grande impacto ambiental gerado na construção das barragens.
Morando na roça sou testemunha, em pequena escala, dos infortúnios que acometem nosso planeta. Vi um vizinho que, para tornar suas estrada de terra mais nivelada, retirou com uma retro-escavadeira, uma protuberância rochosa que aflorava na superfície da dita estrada. Algo do tamanho de uma bola de basquete. A parte que estava abaixo do nível era do tamanho de um fusca. Ao invés de aplainar apenas a protuberância, retirou toda a rocha. Depois a máquina alisou a estrada e o serviço ficou “dez” como dizem na região que moro. Meses depois, na primeira grande chuva, a estrada desceu inteira naquele ponto, já que a pedra que segurava o barranco não estava mais lá e o peso da terra encharcada não resistiu e desceu com tudo.
De outra feita, para melhorar a vista de sua casa, um “neo-rural” (urbanoide cheio de certezas, recém-chegado à zona rural) cortou uma barreira de árvores que os antigos haviam plantado, para justamente fazer a contenção dos ventos naquele ponto. A experiência diz que para cada metro de altura, a proteção é de três metros lineares. Uma árvore de 20 metros, por exemplo, protege 60 metros de espaço adjacente. Conclusão, alguns anos depois, num vendaval, o vento sem obstáculo levou o telhado todo da casa, agora, com a linda vista.
Somos parte da natureza, e uma parte bastante frágil. Todo progresso dever vir inexoravelmente acompanhado do respeito e entendimento com a natureza.
Sempre me referi – e fui bastante criticado – por conta de minha postura contra o movimento “Save the Planet”. O planeta está pouco se lixando para nós. Bastam mil anos sem a civilização humana que tudo volta às origens. O ar se purifica, a água se torna cristalina e a Terra continua a girar, girar em torno do sol. Temos é que nos salvar: a nós!
Luiz Inglês
Bananal-SP
Maio de 2024