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Meu último ato



Era segunda feira de carnaval e poderia ser um feriado como outro qualquer não fosse o dia que prometi terminar algumas demandas iniciadas que precisavam ser urgentemente finalizadas.


Os primeiros raios de sol entrando pelas frestas da janela do meu quarto indicavam que o dia já havia amanhecido, mas minhas pálpebras ainda pesadas teimavam em lutar contra esse fato.

Na pracinha ao lado já era possível ouvir o latido dos cachorros que brincavam enquanto seus donos colocavam a fofoca em dia, alguns sentados tranquilamente em bancos de cimento com coberturas feitas com troncos de árvore que dão um charme todo especial ao lugar, e pensar que tudo ali era mato quando me mudei para cá.


Levantar não é uma tarefa complicada quando se tem uma cachorrinha que faz o papel de despertador, aliás, mais uma vez não precisei dele para despertar, a Nina cumpre bem o papel de me tirar da cama.


Na tela do computador ainda era possível ver o arquivo em word com o livro praticamente pronto, página 172, foi o que consegui ler e revisar no dia de ontem. Engraçado como têm coisas escritas que não me lembrava mais, engraçado como tem coisas que eu realmente adorei, mas o mais engraçado são as coisas que eu não gostei, não sei se pensei assim quando escrevi pela primeira vez mas agora, relendo, fiquei com a sensação de que realmente eu poderia ter me esforçado mais.


Um café bem forte é isso, mas primeiro os três comprimidos que garantem que minha glicemia se manterá quietinha, tranquila e sem me deixar preocupado, é o tempo necessário para que a água ferva e o coador faça seu papel de absorver todo o líquido quente que logo estará pronto para ser degustado.


Adoro café, mas não me lembro do gosto dele com açúcar, faz muito tempo que passei a beber com adoçante, de aspartame, por favor, não me adapto a outros tipos de adoçante.

Um gole lento para poder sentir bem o gosto do café ainda quente, quem sabe isso me ajude a finalizar minha demanda do dia. Preciso entregar o livro finalizado afinal de contas o editor já enviou o contrato para a publicação, mas nem sempre finalizar uma obra literária é uma tarefa fácil.


Uma lida nas notícias para ver se alguma coisa mudou no mundo... Parece que tudo continua igual, a única diferença que percebo é o sumiço dos entendidos em vírus e vacinas dando espaço aos entendidos em geopolítica. Realmente nada mudou.


Mais um gole no café enquanto me pego sorrindo pensando na quantidade de absurdos que a internet nos proporciona todos os dias, talvez eu devesse voltar escrever naquela rede profissional, eu sei que eu tinha um alcance legal, mas tudo aquilo começou a deixar de fazer sentido no momento em que as pessoas começaram a dar mais importância aos números do que aos conteúdos, não vou ficar horas produzindo algo que não será entregue pelo algoritmo que desisti de tentar entender.


Falta pouco para finalizar o livro, só não decidi se deixo como está ou se faço algum tipo de fechamento, um capítulo final ou algo parecido. Enquanto me preparo para revisar as últimas páginas ouço mais cachorros na praça, uma espiada não vai fazer mal e quem sabe me ajude a finalizar esse trabalho despretensioso que começou... Na verdade não sei direito como começou, mas a coisa foi ganhando corpo e quando eu percebi tinha um livro pronto, só precisava enviar para a editora e aguardar a aprovação do projeto.


O interfone interrompe o silêncio que até então era minha única companhia, do outro lado uma voz que conheço bem me avisa que vieram entregar uns móveis de escritório que comprei, eu havia me esquecido que prometeram a entrega para hoje, parece que vou ter que parar para receber os montadores e isso com certeza vai me atrapalhar mais uma vez.


Talvez seja melhor apenas terminar a revisão e deixar o livro sem um final, a ideia de deixa-lo com um ar de mistério pode levar as pessoas a interpretarem da forma que quiserem, e o que é melhor, pode abrir espaço para que em outro momento eu volte e finalize de maneira brilhante, coisa que com toda certeza não conseguirei fazer hoje. Talvez eu nunca consiga fazer, vai saber.

A conversa sobre mesas e armários não está me ajudando, minha cabeça viaja nas mais diversas direções, e não me parece que conseguirei chegar a algum lugar interessante, até que um dos montadores me diz uma coisa que salvou o dia.


“Seus móveis estão prontos senhor, por favor, verifique se está tudo ok porque quero muito ir embora para casa. Seus móveis foram os últimos do dia, meu último ato, e assim finalizo meu dia com o sentimento do dever cumprido.”


Sim, é isso... Meu último ato para finalizar o livro com o sentimento do dever cumprido.


Pronto, acho que agora está pronto, aproveito para agradecer as pessoas que me ajudaram a concluir esse projeto, as que me incentivaram e principalmente as que terão acesso às histórias que criei e compartilhei em pouco mais de duzentas páginas, acho que o resultado final ficou melhor do que eu imaginava, sendo assim meus caros e minhas caras só me resta me despedir de vocês, pelo menos por enquanto, logo mais estarei de volta, afinal semana que vem é logo ali.


Paulo Eduardo Ribeiro, do Canal Ponte Aérea, para CRIATIVOS!


 

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