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Memórias de um cachorrinho Maduro (8)


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   Mamãe vive dizendo que eu sou um ótimo viajante. Sou mesmo! Au Au!  Adoro viajar pelas estradas e ver tudo passando, ficando velho, desaparecendo, e ficando diferente e novinho de novo! Só fiquei nervoso naquela escada maluca do lojão em S Francisco. Mas adoro cidades grandes, onde todo mundo sabe que eu sou celebridade!


  Quando Mamãe foi pro Brasil, pensou em me levar na mala do avião como a Maya foi pro Hawaii com o Chris, mas ficou com medo de me “traumatizar”, ficava dizendo “Imagina se eu vou botar essa coisinha na barriga do avião, ouvindo o maior barulho, tá louco!”


   “Ele é surdo!”, o Chris dizia.


   “Não é! Ele tem ouvido seletivo! Eu canso de mostrar isso!”, ela reclamava. 

    Eu não ligo que o Chris ache o que quiser porque eu amo estar com ele. Eu grudo nele muito mais do que a Maya. Ela fica toda esnobe e às vezes se aboleta em qualquer lugar da casa, só porque sabe que ele não deixa ela pra trás. Mas sou eu que fico o tempo todo bem perto dele.


   E fico meio zangado quando mamãe fica toda super carinhosa com a Maya. Eu não reclamo, mas fico reprovando a mamãe com o meu olhar. Ela diz que a Maya é igual a uma gazela, e a Tweety já disse que a Maya parece um cisne porque ela tem um pescoço grande e da um jeito de olhar pra baixo que o nariz comprido dela inclinado fica igual a um bico de cisne perto daquele pescoção. Nessas horas, eu tenho que ficar me lembrando que cisne ou não cisne, o pedigree sou eu!


   Mamãe também chama ela de “princesa Maya”, e aí eu tenho que me relembrar ainda mais que eu sou o verdadeiro “Cavalier King Charles”, da raça que os aristocratas ingleses sempre tinham perto deles.


   Adorei as viagens de carro que mamãe e Tweety me levaram, com a Tweety na direção! Quero contar essas viagens, que foram duas de ida e volta daqui pra Boulder. Na primeira vez, tivemos que sair daqui de repente porque a casa teve um vazamento que estragou o chão, e as máquinas que botaram pra secar aquilo pra poder mudar o piso faziam um barulhão. A mamãe dizia que ela se sentia dentro de uma fábrica.


   Eu sou muito bom pra viajar de carro. Levamos 3 dias na estrada e passamos duas noites em hotéis que aceitam cachorro. Primeiro, atravessamos todo um deserto no sul da California pra poder chegar no Arizona, num calor fortíssimo! O ventinho gelado do carro estava o mais alto que podia mas mesmo assim, eu respirava muito rápido e de língua de fora. Já disse que sou um cachorro alérgico e já saí de casa com um olho inchado e quase fechado.


  “Deus que nos acuda, não podemos nem levar ele pra uma emergência! Vem cá coitadinho, vou te botar bom, você vai ver!” mamãe falou quando viu o meu olho. Pegou um colírio dela e pingou nele. Teve que explicar pra Tweety que era um colírio muito simples que só podia fazer bem porque a Tweety e o Chris desconfiam de remédios. Durante a viagem, continuou pingando o colírio e cada vez que olhava pra mim eu estava melhor. Fiquei bom.


   Mas no meio daquele calorão do deserto, eu ainda estava com cara de bêbado, um olho meio fechado e o outro aberto. Quando paramos num posto de gasolina, mamãe saiu comigo na coleira e botou água numa vasilha que tinham no carro pra eu beber. Passeou um pouco comigo pra eu fazer pipi mas não fiz nada. Parecia que a gente estava entrando em uma lareira, e eu com a minha cabeleira calorosa nem me entendia direito. Entrando no Arizona choveu muito e chegamos no hotel de beira de estrada que aceita cachorro no meio de um aguaceiro.


   Era muito legal aquele hotel, tinha um parquinho cercado onde eu podia fazer coco e correr. Tinha um tanque cheio de água pras pessoas darem banho nos cachorros delas se quisessem, mas eu só tomo banho no meu spa. Logo que entramos no quarto, Tweety e mamãe se olharam e disseram que estavam pensando a mesma coisa, com medo do hotel ser de algum louco como o cara chamado Norman Bates, de um filme de terror.  Elas se olharam com medo, mas eu sentia que estávamos em segurança. Qualquer coisa, eu salvava elas!


   A luz do quarto era uma bola feita de espelhinhos que refletiam nas paredes. Tweety falou que era uma luz de discoteca dos anos 70. Tinha uma geladeirinha debaixo de uma mesa e mamãe botou a minha comida nela. Tinha tudo que a gente precisava, mas os restaurantes eram na cidade e elas saíram pra ir jantar. O quarto tinha duas camas grandes, eu ia de uma pra outra todo feliz e até me curtia no espelhão que tinha na parede.  


   De manhã cedo continuamos a viagem pra Santa Fé. La sim, encontrei o hotel dos meus sonhos. Era um monte de quartos separados num jardim japonês enorme, cheio de escadas que viravam pra tudo que é lado. O lugar de deixar o carro era longe do quarto e de tudo no hotel, então Tweety me levou na coleira de um lado e carregando a mala de mão no outro lado escada acima. Mamãe ia atras com a mala de mão dela e a minha comida, e ficou tão cansada naquele sobe, vira pra lá e vira pra cá que teve que sentar no meio da escada. Estava com medo de ter um “troço” porque Santa Fé é ainda mais alto que Boulder e a pessoa fica muito mais cansada quando sobe escada.  A Tweety sumiu da vista dela mas voltou pra ajudar.


   O quarto da gente tinha uma entradinha ao ar livre que era só da gente, e lá dentro era muito bonito. Tinha tudo que alguém ou um cachorro pode precisar, ou na geladeira, ou em cima da pia do banheiro, ou na mesa de cabeceira, ali era o paraíso das pessoas e dos cachorros. Mamãe não parava de elogiar e ficava dizendo, “Esses japoneses pensam em tudo!”


    O restaurante era no topo do jardim, então mamãe dava o meu jantar e elas iam lá pra cima comer. Eu nem reclamava, virava o dono do lugar. Quando voltaram, mamãe foi me levar lá fora pra fazer pipi, e eu tive uma grande surpresa! O lugar estava cheio de umas conchinhas redondas que iam andando devagarzinho porque tinham um bicho dentro delas. Pra que! Bicho no meu caminho vai logo pra minha barriga. Dei mil botes nas que vi e nas que descobri pelo cheiro, escondidas nas plantas. Não parava de dar bote em todas as direções e tão rápido que mamãe nem chegava a ver o que eu estava caçando. Mas quando ela ouviu a concha sendo quebrada na minha boca, logo adivinhou!


   “Meu Deus! Você está comendo os caramujos! Que rapidez!”, falou toda preocupada, achando que aquele petisco podia me dar dor de barriga.


   Quando voltou pro quarto, contou pra Tweety que eu comi “escargots au naturel” e disse “Ele agora tá muito chique! Comendo prato francês no café da manhã! Não vai querer mais nada, não é minha coisinha?” e olhou pra mim.


   Se as conchas eram “escargot” ou não, eu adorei comer elas inteiras com a caça toda macia ali dentro. Quando saímos do quarto pra continuar a viagem no dia seguinte de manhã, consegui abocanhar mais umas três! Acho que nunca fui tão rápido na vida!


Thiago Kobe, um grande artista brasileiro, na Cedro Rosa.



Trilha sonora de alta qualidade, na Spotify / Cedro Rosa.




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