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Memórias de um Cachorrinho Maduro (11)

Atualizado: 3 de jun.


Eleonora Duvivier
Eleonora Duvivier

Tô zangado. E triste, ainda por cima.

Hoje não funcionou a mamãe tentar fazer o Chris me levar, quando ele saiu junto com a Maya.


Ainda por cima a canina hospede minúscula ainda está aqui, e segue a mamãe por tudo que é lado. Até se atreve a montar guarda: Outro dia eu entrei no quarto e ela ficou rosnando que nem uma maluca.  Tenho que ficar me lembrando que ela é um cão da linha do tal Pavlov, que associa a sua comida com seja quem ou seja o que for e aí fica condicionado a seguir o seja quem. Eles não têm o tal do “livre arbítrio”, que a mamãe acha o máximo. Mesmo assim, fico com medo de aquela metida conseguir me desmoralizar pra mamãe!


   Mamãe botou a cesta dela com ela dentro bem em cima da MINHA cama, e eu que sou orgulhoso, decidi não chegar nem perto daquele quarto. Mamãe diz que como a hopede é muito pequena, pode desaparecer em qualquer lugar da casa, ainda por cima se for lá fora, então tem que ficar de olho nela. Tem que ficar de olho também pra quando ela quer fazer pipi, porque ela vai pra perto de uma das portas, mas não sabe pedir, como eu sei. A Maya late perto da porta quando quer ir lá fora, mas eu, que sou sutil e muito “vocal” como disse o cara que me vendeu pra Tweety, faço uma voz especial; um pedido mesmo.

   A cachorrinha ia embora hoje, mas a dona dela pediu pra ela ficar mais um dia. Já fico pensando que ela deve querer mais é deixar a hospede de vez com a gente. Como fez o tal “príncipe” árabe amigo do Chris, ao deixar a Nora. A Nora já era tão ou mais velha do que essa que veio se hospedar aqui. Tiveram que despachar a Nora deste mundo, porque nem mais podia andar direito, e ficou com uma diarreia com sangue. O veterinário que veio dar as injeções nela trouxe a mulher dele, que era uma loura horrível que só falava em dinheiro, dizia quanto ia ser isso e aquilo, quanto mais seria se a mamãe quisesse dois moldes da pata da Nora pra dar uma pro dono dela, que saco!


   Aquele casal bem parecia da família Adams, mas o homem ao menos não parava de dar condolências pro Chris, pra Tweety e pra mamãe, com uma cara super infeliz. Só de olhar a Nora, ele sacou tudo. Falou que a diarreia não ia curar porque tinha a ver com a coluna dela, que estava afundada por causa de artrite, e dali a pouco, ela não ia mais poder ficar em pé. Falou que quando isso acontece, o cachorro fica com muito medo, e que a gente estava mandando ela pro céu na hora certa.  


   Mas Mamãe sofreu muito e ficava escondendo o choro. O veterinário disse pra deixar eu e a Maya cheirar a Nora logo depois que ela apagou. Falou que a gente devia perceber que ela se foi de vez, pra não ficar procurando ela pela casa.


   Mamãe foi contra e disse a ele que era melhor a gente não cheirar nada e pensar que ela se mudou.  Afinal, o dono dela, o tal “príncipe”, durante todos os anos em que ela morou com a gente, já tinha buscado ela uma ou duas vezes por alguns dias. Queria fingir que era um bom dono. Resolveu deixar ela de vez porque teve um bebê com a mulher dele, o folgado.


  “Eles não vão cheirar nada não!” mamãe falou pro veterinário, tentando tirar a gente de perto.

   A Maya não tava nem aí e foi correr lá fora. Mas eu, que sou maduro, fui encarar. Mesmo contra a vontade da mamãe, consegui dar uma cheirada no canto onde a Nora tomou as injeções. Fiquei péssimo! Passei o resto do dia jogado num sofá. Senti o cheiro do que não se aceita. Do “já era”. Do nunca mais.


   “Que gente mórbida!” mamãe reclamou furiosa, depois que casal foi embora carregando a Nora.  Aí, se sentou do meu lado no sofá onde eu estava, e falou:


   “Coitadinho! ficou com angústia existencial! Precisava disso? Fica numa boa, meu Luluco, você é um cachorro jovem!  Vai esquecer! Olha como é bom quando eu coço a sua barriguinha!”

   Com aquele amor e a sensação na minha barriga, que é a parte de mim que eu sempre ofereço pras pessoas que querem me acariciar, eu fui mesmo esquecendo. Só lembrei agora por causa da hóspede, que deve ser ainda mais velha do que era a Nora. Mas ouvi o meu veterinário dizer que cachorro pequeno vive mais do que grande.


   Eu não tenho saco nem pra cachorro jovem, nem adulto, e nem velho. Os jovens só querem fazer palhaçada; os velhos e os adultos nunca chegam a ser maduros como eu.


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