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SINS



Nunca havia utilizado carros de aplicativos dirigido por mulher  ̶  e recorro ao serviço com razoável frequência. Não deveria ser estranho ser recebido por uma motorista, mas é, de certo modo  ̶ sem hipocrisia. Ainda, por incrível que pareça, não estamos acostumados com mulheres ocupando posições, há menos de 25 anos, praticamente exclusivas dos homens.


Ela estava na faixa dos 35 anos, muito bonita  ̶  dentes perfeitos de tão brancos e reluzentes, educadíssima, bom vocabulário, carro limpo  ̶  pasmem  ̶  e ar ligado  ̶  pasmem bis. Esse cenário é raro nos carros de aplicativos do Rio de Janeiro. Não me refiro à beleza da motorista, mas, sim, ao ar ligado e ao asseio interno.


O Rio virou a meca da falta de respeito às leis. Por aqui, quem manda é o antiestado, e essa macrossituação vexatória que se arrasta por anos e anos de desgovernos  ̶ evidentemente, reflete-se nos pormenores do dia a dia: jogamos lixo no chão, não respeitamos sinais de trânsito, desconhecemos o desenho de uma faixa de pedestre. Sumiram o por favor, o por gentileza e o muito obrigado.


Tenho receio de reclamar dos tempos atuais porque o mundo sempre foi deplorável, nos moldes de cada época. Reparem: os problemas e os desafios apenas mudam de estilo e figurinos, dentro do contexto de existir, pois o ser humano é irremediavelmente ruim  ̶ impõe-se pela força, é mentiroso, cretino, cruel, umbilical e capaz de coisas que até a minha neurastenia duvida.


Nossa viagem durou cerca de 20 minutos e, nesse tempo, soube que tem três filhos de três casamentos  ̶  o mais novo com suspeita de ter algum grau de autismo a ser diagnosticado em breve. Disse essas coisas com serenidade impactante: firme, cristalina e verdadeira. Falávamos pelo retrovisor. O carro era autossuficiente. Existiam apenas aquela atmosfera aconchegante, o ar gelado e a penumbra metálica-silenciosa do insulfilm dos vidros.


Contei também algumas histórias, até o assunto, não sei explicar, descambar em música e em Carmen Miranda. Ela, feito eu, admirava muito a Pequena Notável, por várias razões acordadas imediatamente: a afinação magistral, a coreografia perfeita com figurinos pesados, mais o turbante cheio de penduricalhos, sambas-choros aceleradíssimos com letras enormes que ela não errava e nem titubeava, o rosto de boneca e outras mais.


Quase chegando ao destino, contei da única pessoa que tinha me feito chorar no teatro, que foi a Marília Pêra, numa apresentação popular no João Caetano (abarrotado em seus mais de 1100 lugares), no Projeto Seis e Meia, centro histórico do Rio de Janeiro, em 2005, no espetáculo “Yes, nós temos Pêra – Marília Pêra canta Carmen Miranda”.


A Marília estava incorporada na Carmem, e a Carmem, na Marília. Aquelas coisas que só presenciamos uma vez na vida. Um vislumbre mágico e impressionante e impecável em e para todos os sentidos.


E ela disse, estacionando o carro: eu estava lá, era meu aniversário, a primeira vez no teatro. Meu falecido pai me levou como parte do presente  ̶  ele amava a Carmem  ̶  depois jantamos no Lamas. Eu completava 15 anos.


Os meus olhos ficaram rasos d’agua. Desembarquei do carro rapidamente. E lembrei da música do Paulinho, Sinal Fechado.


 

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