MARA
A Mara tinha a autoestima em dia. Era bem resolvida, desde muito cedo dona do seu próprio nariz, que aliás geralmente determinava a direção a seguir e, até ali, não tinha decepcionado. Sempre houve, entre os muitos amigos e amigas, quem criticasse aquele jeito altivo e confiante. Algumas das meninas diziam que ela ia viver sempre sozinha. Os homens reclamavam, entre si, da “indiferença” que ela dedicava a eles, geralmente interessados em algo mais que a amizade dela.
Nada, no entanto, abalava o orgulho de ser quem ela era. E dizia sempre que ninguém a conhecia melhor que ela mesmo. Tinha até um bordão, que repetia pra si e – ocasionalmente – para os outros também: Eu me conheço!!!
Um elemento importante na construção dessa figura quase autossuficiente era o seu porte físico. Cuidadosa com o corpo, mantido sob controle com uma rotina de exercícios e dieta não rigorosa, mas saudável, não conseguiu escapar de ser a mais alta da família, ostentando desde os 14 anos aqueles 1,85m que marcavam presença na chegada, na permanência e na saída de qualquer lugar. Internamente, não era muito feliz com aquele tamanho todo. Tinha lá seus complexos, que nunca deixou que ninguém percebesse. Era daquele jeito e pronto.
Amiga dos amigos, justa com todos, competente e séria no trabalho, levava sozinha uma vida confortável. Ninguém nunca soube – e tinha um grupo grande de amigos e amigas – de envolvimento emocional da Mara com ninguém. Uma fortaleza, a Mara. E os mesmos amigos e amigas nunca deixaram de reconhecer, especialmente na ausência dela, mas eventualmente também em sua presença, o quão atraente ela era. Desde a beleza do rosto até a curiosidade e asfantasias provocadas pela presença de uma mulher daquela altura.
- Eu me conheço!!, ela repetia diante de qualquer insinuação de assexualidade ou desinteresse afetivo feita por qualquer das pessoas do seu meio. Ela simplesmente repetia que não estava afim de se envolver com ninguém até aquele momento, queria continuar investindo na carreira e em seus projetos pessoais, aprimorar seu conhecimento nos dois idiomas que se desafiou a aprender desde muito cedo, o inglês e o francês. Enfim, tinha projetos que poderiam ser interrompidos ou retardados caso se envolvesse seriamente com alguém e por isso seguia sozinha.
Um dos amigos, inconformado e provavelmente com algum grau de psicopatia, não aceitava essa condição. Durante muito tempo, apesar da aparente normalidade no comportamento e da rotina insuspeita, sonhou e fantasiou uma relação, que podia inclusive chegar à estabilidade, filhos e uma casa com varanda e plantas, com a Mara. Se arrepiava todo ao vê-la chegar para o chope das sextas-feiras, quase sempre marcados no mesmo bar, no Centro da Cidade. Mas em anos de proximidade, jamais deixou transparecer a menor afetação ou desconforto. Uma vez ou outra chegou a ficar sozinho com ela no bar aguardando a chegada dos demais, mas soube – ou conseguiu – se controlar.
Também ele era relativamente monitorado pelos outros e outras, em função da solidão. Morava sozinho desde que viera do interior. Tinha se adaptado perfeitamente à vida urbana, mas nunca tinha aceitado dividir o apartamento com ninguém e nem recebia visitas. Alegava sempre que o conjugado era pequeno e bagunçado demais, apesar de ele mesmo se apresentar sempre com a roupa bem passada e aquele jeito de bancário dos anos 70, não raro com um paletó jogado sobre o ombro direito.
O fato é que o Túlio – nome em homenagem ao goleador famoso – num dos encontros de sexta em que bebeu um pouco mais que o recomendado, resolveu empreender uma perseguição secreta, até onde pode ser secreto um plano levado a cabo por um bêbado, à Mara, seu desejo mais recôndito. Feitas as despedidas, encaminhou-se para o lado oposto, mas em pouco alterou a direção e acessou a estação do metrô pela entrada secundária, imaginando que ainda seria possível alcançar a musa antes que ela embarcasse. Deu certo. Quando se certificou que ela embarcara no primeiro vagão, ele embarcou no último e veio se aproximando por dentro do trem, observando a cada parada se ela não desembarcava, o que frustraria todo o empreendimento. Não podia ser visto. Isso era determinante. Encontrar conhecidos também seria desastroso. Todos sabiam que não morava naquela direção e mesmo elaborar uma desculpa seria custoso sob o efeito de tanto álcool.
Com o trem já razoavelmente esvaziado, seguiu-a no desembarque, numa estação em Copacabana, esgueirando-se nas curvas da estação até a escada rolante, de modo a não ser visto por ela.
Ao alcançar a rua, escura e meio deserta, tudo ficou mais fácil. E pode segui-la por vários quarteirões.
O que fez falhar o roteiro programado foram três elementos não considerados no projeto: 1)Mara já tinha notado o interesse dele, sensível que era, apesar da dureza aparente;
2)Ela não tinha interesse nele;
3)Ela percebeu e acompanhou, atenta e discretamente, a perseguição no metrô.
Resolveu deixar o barco correr, não sem medo de uma eventual abordagem violenta, mas mantendo, graças às pernas longas e fortes, uma distância segura de seu perseguidor. Observada sempre pelos porteiros da vizinhança, cumprimentava a todos e não hesitaria em pedir socorro e abrigo no caso de uma ocorrência fora de controle. Notara também a embriaguez de seu personal psicopata e sabia que a razão não estava colaborando com ele. Numa manobra arriscada, entrou numa pequena rua transversal e viu, escondida num vão, quando ele passou direto, perdendo-a de vista.
Dormiu na casa de uma amiga e riu da história, apesar do risco envolvido.
Na sexta feira seguinte resolveu fazer uma revelação: há tempos namorava, sem revelara mais ninguém, seu professor de francês, o Henri, que tinha apenas 1,50m de altura. Queria poupar a ele do eventual constrangimento diante de todos, especialmente dos homens, tão preconceituosos e avidamente interessados nela e particularmente em seu corpo notável.
Teve a solidariedade das amigas, ao menos aparentemente.
O Túlio, ao que se sabe, conseguiu uma transferência para a sua cidade natal. Menos de um ano depois estava casado e mandou foto dos filhos gêmeos, recém nascidos.
A Mara tá feliz com seu baixinho, agora numa relação pública.
Tudo muito planejado, organizadinho.
- Eu me conheço!!!, ela repete.
Rio de Janeiro, dezembro de 2024.
Criatividade, Ciência e Cultura: Vetores para a Sustentabilidade e Conscientização Climática
A integração entre Economia Criativa, Cultura e Ciência desempenha um papel crucial na conscientização global sobre a emergência climática. Esses setores geram conhecimento acessível, promovem mudanças comportamentais e criam soluções para estruturar uma economia sustentável. Projetos que unem criatividade e inovação podem fomentar emprego e renda ao mesmo tempo que educam a população sobre práticas mais conscientes.
O portal CRIATIVOS! tem sido um exemplo prático desse potencial. Há quatro anos, reúne artistas, cientistas, economistas e intelectuais em uma plataforma dinâmica, fortalecendo a interatividade entre os segmentos criativos e promovendo debates sobre sustentabilidade e economia verde. A publicação da Open Society, The Ideas Letter, com propósitos semelhantes, reforça a importância de iniciativas que conectam pensamento criativo e políticas públicas globais.
A Cedro Rosa Digital, liderada por Antonio Galante, complementa essa proposta ao certificar e distribuir internacionalmente obras e gravações musicais. A plataforma promove diversidade cultural, gerando direitos autorais para artistas de cinco continentes. Projetos como o desenvolvimento do sistema CERTIFICA SOM, que garante crédito justo e direitos autorais internacionais, demonstram o compromisso com práticas sustentáveis e justas no mercado cultural.
Entre os parceiros institucionais que viabilizam essas iniciativas destacam-se a APEX, EMBRAPII, SEBRAE e o Ministério da Ciência e Tecnologia, além de colaborações com associações como ASCAP, SACEM e ECAD. Essas parcerias consolidam o impacto dos projetos na geração de emprego e renda, alinhando cultura e ciência a um futuro mais sustentável.
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