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Uma Chance ao Destino - Capítulo l



Inês Rodrigues - Escritora




– Bom dia, o que vai desejar?


– Estou à espera de um grupo de amigas; importa‑se que peça quando elas chegarem?


De repente uma voz ao fundo:

– Maria, que bom te ver, já há muito tempo que dizíamos para vires ter connosco, mas sempre negavas. Então como tens andado?


– Estive um tempo a refletir, a esse tempo chamo aprendizagem, deixei de viver, sabem? Só há pouco tempo descobri que viver é muito mais que existir e aqui estou prontinha para renascer. Sonhar é quase inato, as minhas ânsias mudaram e a maioria das ganâncias desvaneceram‑ ‑se. Em instantes, sim, porque os dias, os meses parecem correr sem lhes fazeres conta, numa sobreposição de datas e compromissos, dias emparelhados como pares de meias de cores sóbrias em gestos simétricos e automáticos. Fartei‑me da minha vida, ou melhor, rotina cómoda e desinteressante, da qual despertei. Deixei que a minha vida parasse por causa de um homem, sim, por causa de um homem, até me sinto envergonhada ao dizer isto. Como alguém consegue fazer com que a nossa vida pare? Como um mísero homem consegue que os nossos sonhos fiquem para trás? E aquela avalanche de vontade que andava de mão dada com muitos momentos de felicidade? Ficou. Ficou tudo ali durante três anos, sem riscos, tudo certinho, aceitável e expectável. Simplesmente ficou ali, amorfo e parado. Infelizmente fechei durante três anos as caixinhas da minha felicidade e diminui a intensidade das minhas gargalhadas. É isso que é expectável? Um homem ter o poder de amarfanhar assim a vida de uma mulher? É isso que é o amor? Cansei de acreditar que o meu futuro seria ali.


Quando Maria acabou de dizer a última palavra, uma lágrima caiu‑lhe sobre o rosto. As amigas, essas limitaram‑ ‑se a olhá‑la com ar de pena, e não era isso que era suposto. Ter pena dela naquele momento era um sentimento bastante nocivo, mesmo que a intenção não fosse essa. Maria sentiu‑se inferior comparando‑se com as outras amigas.


– Maria, se queres mesmo ultrapassar este episódio da tua vida, desabafa de uma vez por todas aquilo que te magoou durante estes anos, e depois aí sim, depois de sentires a alma mais vazia vais ter o poder de seguir – disse Helena com o seu ar doce e calmo.


– Então é assim: conheci o Hugo há cerca de três anos, por quem me apaixonei perdidamente. Ele era um homem cheio de qualidades, mas também cheio de defeitos ah, os defeitos... como eu os amava, afinal o amor é mesmo isso, não é? É um sentimento raro nos dias de hoje, mas que quando se vive é fácil encontrá‑lo. O amor é um sentimento bom que surge sem intenções. Conheci‑o num café na Rua Direita, foi amor à primeira vista, há quem não acredite que é possível começar a amar apenas com o olhar, mas eu acredito, eu vivi, eu sei o que é. Nesse dia, começamos a falar, fomo‑nos conhecendo, ele cada vez mais entusiasmado em me conquistar, e quando conseguiu finalmente roubar metade de mim, disse que o melhor era afastarmo‑nos.


Nem sabem o que estas palavras me doeram. Tentei… tentei várias vezes fazer com que ele mudasse de opinião, a única resposta que obtive dessas tentativas todas eram um “não sei”, e sabem uma coisa? O pior sofrimento é não saber se se deve desistir ou insistir. Ficar na dúvida magoa, empata e destrói, destrói tanto. Quando existe um “não sei” existe falta de amor, não presença dele e isso custou‑me a assimilar. Mas agora? Agora que aprendi a dançar sozinha, sou a mulher mais feliz da pista.


– Pronto, pronto, já chega de relembrar o passado, devemos viver e não olhar para trás. O passado não volta e só atrapalha o presente e o futuro. Vamos à próxima rodada?


Passaram‑se horas e eram rodadas atrás de rodadas, e quando deram conta, o álcool já atingira. No meio das gargalhadas, ouviu‑se a voz de Teresa:


– Maria, consideras‑te uma mulher feliz?


- Para ser feliz basta decidir sê­‑lo simplesmente. Decidi que não sou mais uma vítima da vida, mas sim a protagonista da minha. No início pensei que esta minha atitude já vinha tardia, mas há uma boa notícia: toda a gente pode mudar a sua vida a qualquer momento, quer tenha dez anos ou oitenta anos. Culpamos muito os outros de tudo. É o medo que nos impede muitas vezes de ser feliz e bem‑sucedidas.


– O que te fez mudar de atitude, Maria? Eras uma mulher muito pessimista, uma mulher cheia de medos, uma mulher retraída…


– Decidi ser uma mulher com M grande, e para sê­‑lo é necessário não nos preocuparmos com o que os outros pensam de nós ou das nossas atitudes, ter opinião própria e não deixar que nenhum homem nos desrespeite. Não ter de rir para toda a gente, sorrir para o problema e levantar‑se cada vez que se cai. Uma mulher com M grande consegue e vai tomar conta de si; isso não impede que ela permita que o homem com H grande possa seguir ao lado dela. Autêntica, genuína, durona, carinhosa, fogo, gelo, fiel… como vos disse no início, a mulher com M grande é o que ela quiser.


– Bem, meninas, vamos andando para a próxima paragem?


A noite ainda era longa para aquele grupo de amigas, a visão delas era a mesma, aproveitar enquanto podem por‑ que as pessoas vão ficando sem tempo e por vezes nem se apercebem.


– Meninas, só um último conselho enquanto estou mini‑ mamente sóbria (soltaram se umas gargalhadas com esta frase de Maria). Tu, tu, tu, tu e tu (foi apontando para as suas amigas), grandeia‑te, para de esperar para mudar, faz o que tens em mente, ninguém mais és tu e ninguém está a ter outra oportunidade.


As cinco amigas ficaram a refletir durante segundos sobre aquela teoria de Maria, mas num instante começaram a caminhar para a discoteca, afinal de contas o objetivo daquela noite era esquecer os problemas e não relembrá‑los. Na discoteca as amigas beberam, dançaram, riram e conviveram, mas de repente viram que faltava uma das suas, era a Maria. Decidiram não ligar muito porque Maria era assim mesmo, nunca estava quieta numa discoteca, andava sempre de grupo em grupo, e talvez ela tivesse ficado à conversa com alguma outra amiga. Passado três horas decidiram ir à procura dela, Maria já estava um pouco bêbeda e tinham medo que lhe tivesse acontecido alguma coisa. Procuraram cerca de uma hora, quando de repente Teresa estreitou os olhos e viu a amiga; foi a correr comunicar às restantes que Maria estava com um rapaz mesmo atrás da discoteca.


Foram ao encontro dela e Helena perguntou:

– Precisas de alguma coisa, Maria?

– Achas que não estou bem acompanhada, é?


Ambas soltaram uma gargalhada. A noite foi passando e Maria tivera passado a noite toda acompanhada por Dinis. Apesar de estar um pouco bêbeda, tinha a plena noção do que estava ali a fazer; ele parecia‑lhe bom rapaz, era charmoso e decidiu arriscar. Tinham‑se conhecido à entrada da casa de banho, foi Dinis que decidiu ir falar com ela, ela apenas aceitou conversar um pouco com ele pois não aconteceu nada além de uma conversa. No final da noite trocaram números de telemóvel e prometeram que aquela não seria a última vez que estavam juntos.


 

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