Um mundo domesticado, empobrecido e em perigo

Recentemente li estatísticas estarrecedoras divulgadas por Sir David Attenborrough, em seu livro “O Planeta Terra” de 2022. Atualmente, 70% da biomassa de aves no planeta é composta por aquelas criadas pelo homem, ou seja, frangos, perus, codornas e outras que servem para alimentação humana. Todas as espécies silvestres que embelezam e enriquecem a biodiversidade planetária somam apenas 30%. Com mamíferos os números são ainda mais assustadores: 96% da biomassa destes consiste em animais domesticados como gado, porcos, ovelhas, cavalos, pets, entre outros. Todo o restante dos animais como elefantes, girafas, tigres, bisões, micos leões, antas, onças, preguiças, baleias, golfinhos e mais uma infinidade de espécies que vivem em diferentes habitats do mundo, consistem em apenas 4%. Como Attenborrough diz: “estamos repondo o selvagem pelo domesticado” (https://www.youtube.com/watch?app=desktop&v=3_WvasZwTqU ). Essas estimativas cruéis dizem muito do nosso modelo civilizatório.
Números como esses precisam ser divulgados para que possamos refletir sobre que HUMANIDADE é essa que se acha tão inteligente, mas não consegue perceber seu doentio e arraigado egoísmo. Não enxergamos nossa própria ignorância, ao deixarmos de lado toda a riqueza que herdamos nesse planeta para priorizar apenas interesses que nos beneficiam em um curto espaço de tempo. E o que é pior, só uma fração dos seres humanos da Terra, menos de 10%, usufruem dos “luxos” criados nos últimos séculos. O restante anseia por padrões de consumo dos privilegiados, mas a quantidade de pobres aumenta e a concentração de renda se intensifica cada vez mais. E esse sonho de consumo para todos não será jamais possível. Existem cálculos que indicam que se toda a humanidade tivesse o que tem um norte americano mediano (e não de alto padrão), já seriam necessários mais de quatro planetas. Ou seja, tratamos como infinito nosso mundinho finito, e seus limites estão chegando ao fim. Não existem mais fronteiras a serem exploradas a não ser em outros planetas, o que já é cogitado por muitos. Mas, me soa como total absurdo, já que o nosso, a Terra, concentra uma abundância inigualável de formas de vida e poderia suprir a humanidade do que precisa, se fôssemos conscientes de nossas responsabilidades éticas para com todos os seres vivos, sejam humanos ou não humanos.
Nunca fui pessimista, mas as provas de nossa insanidade estão batendo às nossas portas. Rios da Amazônia estão mais baixos do que nunca (outubro de 2023), com tenebrosa mortandade de peixes e botos. A água está insalubre para consumo humano numa região conhecida pela sua vasta abundância hídrica. As mudanças climáticas, que muitos insistem em negar, se mostram evidentes em diversas partes do mundo com tufões e ciclones, chuvas caudalosas que causam enchentes e deslizamentos, ou estiagens que ameaçam culturas milenares.
Se olharmos para a economia, dados recentes publicados na Nature Communications, mostram que os danos causados por alterações climáticas chegam a 280 bilhões de dólares. O número é conservador, já que pesquisadores indicam que faltam dados, especialmente de nações de baixa renda. [PP1]
Se quisermos reverter o quadro destrutivo tem que ser agora. E o orçamento nem é tão impossível. No Acordo de Paris, assinado em 2015 e que passou a vigorar em 2016, os países responsáveis por cerca de 55% das emissões de gases de efeito estufa no planeta deveriam assumir diversos compromissos em seus próprios territórios, mas também passariam a investir 100 bilhões de dólares por ano a partir de 2020. Este valor seria repassado pelos países ricos aos pobres, que concentram a maior riqueza natural, mas onde as condições humanas são muitas vezes degradantes. Claro que, como todo acordo internacional, há complexidades e exigências múltiplas para que se cumpram as metas delineadas por todas as partes.
Os debates sobre financiamentos climáticos, seja para evitar o aumento da temperatura ou para combater as perdas e danos causadas pelas mudanças do clima, se intensificaram nas últimas Conferências das Partes, as COPs. A criação de instrumentos para esse combate se faz necessária e pode resultar em impactos relevantes.
Um exemplo de sucesso desse processo de repasse é o Fundo Amazônia, gerido no Brasil pelo BNDES, que tem sido copiado em outros países. O recurso apoia iniciativas para combate à crise climática como produções sustentáveis, ordenamento territorial, monitoramento, ciência, inovação e instrumentos socioeconômicos. Embora se tenha popularizado nos últimos anos uma narrativa pejorativa de que ONGs estão sendo amplamente beneficiadas pelos investimentos desse Fundo e que “fazem o que querem com os recursos”, o fato é que 61% das verbas são destinadas ao governo brasileiro, 38% ao Terceiro Setor (ONGs) e 1% a organizações internacionais. Além disso, os projetos de ONGs apoiados pelo Fundo passam por um crivo de especialistas antes de serem selecionados e são auditados constante e rigorosamente em um processo de total transparência.
Claro que os recursos prometidos pelo Acordo de Paris estariam condicionados a múltiplas medidas proativas de redução de emissões também por parte dos países recebedores e pelo bom uso do que seria repassado. No Brasil, os quatro anos do governo passado foram marcados pela passada de boiadas ensandecidas que inviabilizaram qualquer possibilidade de diálogo nesse sentido. Naturalmente, há também muitas iniciativas que representam investimentos nos próprios países ricos que não vêm sendo cumpridos, que seriam as suas obrigações para responderem aos acordos firmados. O fato é que não parece haver vontade real de salvar o planeta.
Mais recentemente, formou-se um grupo denominado “Global Deal for Nature” (GDN), concebido por cientistas sediados no Arizona, EUA. Segundo eles, os cálculos do orçamento necessário para salvar o planeta é de 80 bilhões de euros anuais (quase o mesmo valor do rendimento de apenas duas grandes corporações norte americanas). Esse valor deve ser destinado a proteger 30% da superfície da Terra até 2030, cobrindo investimentos para mitigar causas das mudanças climáticas, conservar os estoques de carbono natural do planeta e reduzir as principais ameaças atuais. O GDN inclui o setor privado nessa equação, com o envolvimento de grandes companhias, o que pode gerar ainda mais retaliação de políticos extremistas radicais, que dizem querer ajuda, mas na prática não aceitam qualquer interferência de quem investe. A grande inovação do GDN é a inclusão do mundo corporativo, o que reduz a dependência dos governos serem os únicos protagonistas nas decisões.
Em face ao prejuízo causado à Terra e seus habitante por ações destrutivas que causam danos muitas vezes irrecuperáveis, iniciativas e investimentos como esses precisam ser reconhecidos, ganhar impulso e escala. Assim, também não podem ser realizados de maneira isolada. Eles precisam ter participação do setor privado, serem ajustados e colaborarem com políticas públicas para o combate à crise, respondendo aos anseios das populações e às metas globais.
Possível salvar o planeta é! Estudos demonstram que bastaria uma fração do que é gasto em armamento para recuperar áreas degradadas, proteger nascentes e a biodiversidade, além de outras medidas regeneradoras que se mostram urgentes. Mas, atualmente, falar em reduzir gastos com armamento quando vemos guerras eclodirem e ânimos mais exaltados do que nunca, pode parecer impossível. O egoísmo, a ganância, o anseio por poder têm regido o comportamento humano que deixou o bélico preponderar sobre o pacífico. O caminho seria uma revolução radical de valores para se ter chances de remediar os efeitos de nossas escolhas insustentáveis.
Esses valores humanos que regem nossas escolhas e decisões deveriam ser outros. Precisamos aprender a celebrar a riqueza de vida que herdamos aqui e agora. E este é talvez o momento mais delicado da humanidade, pois nosso futuro está em jogo. As forças destrutivas são cada vez mais eficientes e vorazes, assim como a fome por poder e a ganância por posses materiais. Não há uma educação direcionada a “eu me importo”, o que seria fundamental para que a vida fosse valorizada. O desafio é imenso, pois precisamos de mudanças radicais por parte de toda a humanidade. Mas, não me parece promissor ou mesmo possível permanecermos na Terra sem que transformações profundas aconteçam rapidamente.
Onde reside a esperança?
Existem comunidades tradicionais espalhadas pelo mundo com padrões civilizatórios bem diferentes dos nossos. Nelas a cooperação rege o dia a dia, e todos os elementos que viabilizam a vida são valorizados e respeitados. O problema é que essas culturas não são vistas como modelos a serem copiados e sim como “atrasadas” pela nossos padrões dominantes. Lastimável porque teríamos muito a aprender com elas.
Existem, no entanto, milhares de pessoas pelo mundo afora dedicadas a fazer o bem e comprovam ser possível transformar realidades muitas vezes cruéis. Os chamados empreendedores sociais ou socioambientais, são aqueles inconformados com algo que os incomoda a ponto de criarem projetos ou fundarem organizações da sociedade civil, ou mesmo empresas, cujas missões incluem resolver problemas sérios e até imorais, como miséria, doenças crônicas que não recebem a devida atenção, discriminação e abuso de poder, ou questões ambientais que atingem a todos. São essas as minhas fontes de inspiração. Quem quiser também beber dessa fonte, basta acessar os links de organizações como a Ashoka, Empreendedores Sociais da Fundação Schwab e Folha de São Paulo, AVINA, SKOL, e muitas outras espalhadas pelo mundo.
Na verdade, existem “transformadores” de realidades em todos os setores. Alguns políticos são idealistas e trabalham por determinadas causas, assim como empresários, artistas ou desportistas. São pessoas que inspiram. Nesse momento de desesperança, o importante é saber que esses indivíduos existem, atraem outras pessoas que aderem às suas causas e acabam por fazer diferença onde quer que estejam porque “se importam”. Essa talvez seja a chave mestra: se importar a ponto de transformar. São essas as pessoas que deixam o mundo mais rico, menos “domesticado” e mais esperançoso de um futuro saudável e possível para muitos.
Suzana M. Padua especial para CRIATIVOS!
[PP1]https://www.nature.com/articles/s41467-023-41888-1
Cultura, Ecologia, Desenvolvimento Sustentável e Economia Criativa
Trilha sonora excepcional de artistas brasileiros da Cedro Rosa, no Youtube.
A interação harmoniosa entre Cultura, Ecologia, Desenvolvimento Sustentável e Economia Criativa pode resultar em um ciclo virtuoso que promove desenvolvimento, emprego e renda. Eis cinco exemplos de como esses elementos podem trabalhar em conjunto:
Turismo Sustentável: A valorização da cultura local e da ecologia através do turismo pode criar empregos, gerar receita e preservar o meio ambiente, desde que seja feito de forma sustentável.
Artesanato Sustentável: A produção de artesanato, utilizando materiais locais e práticas sustentáveis, não apenas preserva a cultura, mas também gera renda para comunidades.
Agricultura Orgânica e Agricultura de Conservação: Práticas agrícolas sustentáveis preservam ecossistemas, proporcionam alimentos saudáveis e criam oportunidades de emprego.
Energias Renováveis: Investimentos em energias limpas promovem o desenvolvimento sustentável, reduzem emissões de carbono e criam empregos na indústria de energia renovável.
Indústrias Criativas: Setores como design, música, moda e tecnologia podem aproveitar a cultura local e promover inovação, gerando empregos e crescimento econômico.
Nesse contexto, surge a Cedro Rosa Digital, uma plataforma inovadora que está revolucionando a cena da música independente no cenário global.
Escute esses grandes artistas brasileiros na playlist Cedro Rosa, na Spotify.
Ao utilizar a tecnologia digital para conectar artistas independentes brasileiros a audiências globais, a Cedro Rosa Digital está fortalecendo a diversidade cultural e musical do Brasil, ao mesmo tempo em que solidifica sua presença como centro de criatividade e inovação no cenário musical internacional.
A plataforma oferece ferramentas de promoção e distribuição que capacitam artistas independentes a alcançar audiências globais, fortalecendo ainda mais a cena musical independente do país.
Comments