Três tiros na noite
POU! POU! POU!
Foram os últimos sons que ouviu.
E, de repente, não mais que de repente, ali estava ele, no chão, morto.
Mas o que terá acontecido para tudo desaguar neste final tão fatal, se tudo parecia tão bem encaminhado?
Tudo tão certo.
E agora, tudo assim, tão certo como dois e dois são cinco.
Desde que conheceu Maria que ele, o Juvenal Infernal, malandro de sete costados, valente temido em todas as rodas, amante disputado e matador desalmado, passou por uma transformação que só pode mesmo ser explicada, e compreendida, por muito amor.
E não foi uma transformação que se deu aos poucos, não.
Foi olhar nos olhos de Maria e ver que a vida nunca mais poderia ser a mesma.
Nem ele poderia ser o mesmo.
E já naquela primeira dança no baile do bairro Juvenal se transformou.
Chegara, como sempre, cercado de medos e apreensões.
E, como sempre, a música parou para que ele exibisse sua valentia, recebesse as reverências e escolhesse quem seria sua parceira aquela noite.
Estivesse acompanhada ou não.
E foi enquanto passeava os olhos pelo salão que ele a viu.
Nunca vira antes, porque nunca antes ela estivera por aquelas bandas.
Era do interior de Minas Gerais e viera passar uns dias com a prima, Ritinha.
A paixão foi imediata e avassaladora.
De ambas as partes.
E naquela noite, pela primeira vez, a comunidade viu Juvenal Infernal pedir licença a uma dama e convidá-la educadamente para uma contradança.
Também naquela noite, pela primeira vez ele não tomou como sua a dama que o acompanhava, para depois largá-la numa esquina qualquer (e ela que se virasse a partir dali).
Ao contrário, fez questão de deixar Maria no portão de casa, intocada, e ainda esperou que ela entrasse em segurança.
E acabaram-se as noitadas e as amantes.
E acabaram também as demonstrações de valentia.
Parece inclusive que o viram procurando um emprego decente.
E assim se passaram os meses naquele namoro quase juvenil.
Até aquele dia em que o paraíso bateu à sua porta e Maria se deu de vez e completamente aos prazeres da paixão.
Mesmo com seu pouco estudo Juvenal era amigo das palavras, desde que se bacharelou nos versos de improviso das melhores rodas de samba da cidade.
Mas ali, extasiado na cama, ao lado do corpo nu, cansado e feliz de Maria, ele não conseguia encontrar nenhuma palavra que traduzisse a sua felicidade.
E sonhou a noite toda com ela e os filhos que teriam e os netos que chegariam e uma família feliz para todo sempre.
Passaram o dia em trocas infinitas de carinhos e declarações de amor.
Já era noite quando a deixou em casa e saiu pelas ruas, distraído, quase flutuando.
Acontece que um homem com o seu passado não pode nunca mais se distrair na vida.
Os inimigos estão atrás de cada árvore.
E foi assim que aconteceu.
POU! POU! POU!
E, de repente, não mais que de repente, tudo se acabou.
Nunca mais os olhos e os carinhos de Maria.
Nunca mais aquele perfume de rosas.
Nunca mais aquele corpo macio e cheio de amor.
Tudo isso agora estava destinado a outra pessoa.
Até a próxima esquina.
Ouvindo o CD de Mariozinho Lago, Paulao 7 Cordas e os Cocorocas
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