Petrópolis - o que poderia ter sido evitado ?
A tragédia de Petrópolis, que se repete de tempos em tempos, melhor dizendo , cada vez a intervalos menores e com gravidade crescente, exige a adoção de várias medidas. Três delas são muito urgentes.
A primeira é gestão integrada da bacia do Rio Piabanha. Este rio nasce na vertente interna da serra do Mar, dentro da cidade. Caprichosamente canalizado na época do Império, num tempo que os vales de seus pequenos tributários eram cobertos de matas e com elevado índice de infiltração das chuvas (ou baixo índice de run-off como dizem os hidrólogos), ele viu a completa modificação da sua bacia nestes quase 200 anos de existência da cidade. Hoje qualquer chuvinha adquire características torrenciais. A água escoa rápido pelos telhados e calçamentos , adquire velocidade, carrega o que está pelo caminho e deságua no Piabanha.
Petrópolis tem cerca de 350.000 habitantes e uma das mais significativas taxas de ocupação residencial em áreas de risco elevado de deslizamento ou inundação. Não é de se estranhar portanto que ocorram tragédias. O que é de se estranhar é que da tragédia anterior até a seguinte, a situação só piore. (continua)
A perspectiva de maior frequência de eventos deste tipo trazida pela mudança climática, exige ação imediata. É farta a literatura técnica sobre o assunto e mesmo a nossa legislação prevê medidas que , se adotadas, mitigariam as tragédias. As medidas não são cumpridas, simplesmente. Um relatório do Grupo de Trabalho especial do Ministério da Integração Nacional, datado de 19 de abril de 2011, elaborado após o desastre de janeito de 2011, traz recomendações importantes. Seus autores são profissionais acatados. O relatório traz as visões do Ministério da Integração Nacional, Ministério da Ciência e Tecnologia, CONFEA, Cáritas, ACRJ, FGV .
A segunda medida é se evoluir do conceito de Defesa Civil para Proteção Civil. Defesa Civil é aquele conjunto de medidas que se adota quando o desastre já ocorreu ou na iminência dele. Proteção Civil não só engloba a defesa civil mas tem o sentido antecipatório dos eventos e preventivo de seus efeitos negativos.
Ela parte da existência de centros de monitoramento do clima, avaliações frequentes de edificações em situação de risco, fiscalização de construções irregulares e danos à natureza etc. Ela procura evitar as surpresas promovendo quando inevitável a retirada dos moradores dos locais passiveis de serem atingidos. Neste contexto também el trata do cadastro de voluntários permanentes, incentiva lideranças por bairro e instituições de caridade e filantrópicas que atuam neste campo.
Atenção especial é dada à acolhida digna das populações desalojadas. O menos possível de improvisação. Nada de ocupar colégios , em geral por meses. Nada de se instalar dispendiosos hospitais de campanha. Que se disponha de locais adequados para uso nesta ocasião. E , o mais importante no caso, deslocamento das ocupações em área de risco para locais seguros , custe o que custar, em conjunto com a Defensoria e Ministério Público que frequentemente dificultam, acredito que com boas intenções, os remanejamentos. As populações destas ocupações sempre acusam o governo de querer aproveitar a deixa para fazerem o que chamam de faxina social. Politicas corretas , transparência e ação competente amparada por um bom sistema de informação e comunicação ao público.
Ainda nesse tópico a organização de redes de proteção emergencial envolvendo setor público, voluntariados e filantropia deve estar previamente estruturada. Lamentáveis cenas , e dolorosas, foram presenciadas ao lado de uma ridícula guerra de Prefeituras querendo aparecer no noticiário. A Cáritas iInternacional tem boa experiência nestes esforços. A Prefeitura de Petrópolis agiu com dignidade frente a outras instituições oportunistas.
Por fim e não menos importante uma responsabilização dos omissos deve ser feita de forma institucionalizada e não através da mídia e a omnipresente rede de fake-news. É livre a manifestação mas a irresponsabilidade com que uns comunicados são conduzidos realça a importância da qualidade do poder público confiável. A mídia pode evidentemente cobrir os acontecimentos como achar melhor, sabendo-se que não cabe a ela julgar.
Não se pode simplesmente varrer a poeira ou passar o rodo nas águas. Os mortos e seus parentes clamam por justiça. E omissão ou inação não podem ser toleradas.
Leia ouras crônicas de José Luiz Alquéres na Criativos!
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