E alguém ainda duvida de mudanças climáticas?
Não é de hoje que os cientistas alertam para os perigos das mudanças climáticas e da necessidade da humanidade mudar sua forma de vida. José Lutzemberger já divulgava, em 1974, as consequências desastrosas que resultariam da forma com que as áreas naturais estavam sendo destruídas no próprio Rio Grande do Sul, como mostra a charge abaixo. Pode não ser a única causa, mas a retirada da cobertura natural certamente contribui para o que está ocorrendo agora, maio de 2024, com 80% do Estado debaixo d’água. São vidas que se perdem, lares e bens pessoais e empresariais arrasados, safras que alimentariam milhões de pessoas arruinadas, dignidades destruídas e sonhos que desfalecem. E tudo por uma “surdez” proposital em prol de práticas insustentáveis e irresponsáveis. Interesses de curto prazo, que em geral visam ganhos para poucos com consequências devastadoras para muitos.
Charge do jornalista, cartunista e ambientalista Carlos Iotti (@iotticarlos), muito conhecido no Rio Grande do Sul.
Pensar em longo prazo, prever e se importar com os resultados do que se faz não é prática comum no modelo de desenvolvimento que predomina no Brasil e no mundo. Mesmo que informações com bases científicas indiquem que os caminhos estão equivocados, a ganância e a irresponsabilidade têm prevalecido. Exemplos incluem o uso de plástico uma só vez, que acaba nos oceanos e criam ilhas de dejetos indissolúveis por anos infindáveis, combustíveis fósseis que deveriam ter sido abolidos há muitos anos mas ainda se vê como prática em muitas partes do mundo, além de desmatamentos ou degradações, sempre com argumentos “convincentes” da sua importância, mas que levam à destruição de nossas áreas naturais.
Tudo isso e muitas outras práticas resultam em mudanças climáticas que vêm sendo preconizadas pelo mundo científico há décadas e cujos efeitos poderiam ser evitados. Urge que a proteção de nosso planeta se torne meta principal de nossas decisões.
A injustiça social leva ao acirramento de diferenças entre ricos e pobres dentro e fora do país. Quem mais sofre são os menos favorecidos, que raramente tem apoio para se recuperar das perdas. Em termos globais, no primeiro mundo a comunidade científica é mais ouvida, mesmo aquém da necessidade, como expressam os gritos raivosos da jovem Greta Thunberg, quando chama atenção e atrai adeptos à causa climática de todo o mundo. Clamam por novas medidas desenvolvimentistas, chegando a participar de eventos importantes como Convenções do Clima, ou o Fórum Econômico Mundial.
Além disso, a recuperação das áreas devastadas se dá com mais rapidez e eficácia porque ações concretas e grandes investimentos são destinados para sanar os prejuízos.
O Brasil, no caso do Rio Grande do Sul, está realizando aportes significativos, além da solidariedade que vem de toda parte do país. Infelizmente, no entanto, a história tem mostrado que quando algo trágico ocorre, o apoio da sociedade tende a cair no “esquecimento” após algum tempo. Ocasiões em que outros países pobres (inclusive muitas regiões do Brasil) passaram por eventos climáticos extremos houve falta de ajuda de longo prazo e os estragos e perdas ficam por longos períodos ou até para sempre.
São os valores humanos que levam a situações como as que estão acontecendo nessa tragédia climática do Rio Grande do Sul. O ser humano não valoriza a vida e com isso desrespeita limites. A maior riqueza do Brasil, a biodiversidade, que compreende todas as espécies, formas ou elementos que permitem que a vida aconteça, antes proliferavam em todos os cantos do país. O mesmo se observa no restante do planeta, especialmente no Sul, que concentra maior biodiversidade.
Todavia, temos assistido desmatamentos, exploração insustentável de minérios com garimpos ilegais que destroem rios e solos em locais riquíssimos em diversidade biológica (como a Amazônia), uso indiscriminado de agroquímicos, muitos proibidos em outras partes do mundo, mas com uso indiscriminado no Brasil com impactos extremamente negativos aos ambientes naturais. Essas são algumas das ações humanas cujas consequências intensificam eventos climáticos extremos, como as enchentes no sul do Brasil.
O ser humano tem imensa dificuldade em perceber que seus atos geram consequências. E também não leva em conta que somos conectados à natureza. Com isso, sua proteção é colocada em planos desprezíveis. Das verbas governamentais, menos de 1% é investido em prevenção de desastres ambientais. O orçamento para o Ministério do Meio Ambiente é pífio (menos de 1% dos gastos públicos, um dos menores do erário do país, segundo o site Portal da Transparência). Pior ainda é o Ministério dos Povos Indígenas, que recebe a vergonhosa quantia de 0, 01% do orçamento governamental (informação disponível no site Portal da Transparência), mesmo que suas terras sejam as mais bem protegidas, o que também não é contabilizado como valor para a grande maioria dos tomadores de decisão.
Prioridade tem sido o que gera ganhos econômicos, sejam individuais ou coletivos. Por isso, a natureza ainda representa e é tratada como uma mina inesgotável de recursos, disponível para suprir as crescentes demandas da espécie humana. Seu valor intrínseco acaba se restringindo a ambientalistas ou pessoas com maior compreensão do valor da vida.
Nesse cenário, tudo o que depende de investimentos de longo prazo, mesmo o que é indispensável para o bem-estar humano como saneamento, proteção de áreas naturais, educação, saúde e pesquisa, não fazem parte da maioria das escolhas políticas. Essas precisam ter resultados rápidos, pois os mandatos de quatro anos dependem de realizações demonstráveis que garantam reeleições. Como só os seres humanos votam, muitos investimentos que protegeriam outras espécies dependem de porta-vozes para elegerem quem prioriza e beneficia a natureza e a coletividade.
Somos influenciados pela comunicação, que vem aprendendo a manipular as opiniões da humanidade e muitas vezes com mentiras. O melhor exemplo são as fake news, que levam tempo e recursos para serem desmentidas. Inventar inverdades que prejudicam ainda mais quem está sofrendo com perdas dramáticas, como na tragédia do Rio Grande do Sul, é inconcebível. É cruel! A comunicação precisa ser pautada por ciência e não fake news. Se assim fosse, eventos climáticos, que tendem a se intensificar, poderiam ser minimizados.
É verdade que o compasso da divulgação científica é aquém da necessidade com que os problemas acontecem na atualidade. A modernização dos meios de comunicação deve estar a serviço das necessidades atuais. A tecnologia avançou e hoje as notícias chegam em tempo real. O mundo mudou e não há dúvidas quanto às melhoras em muitos campos. Mas, a tecnologia é neutra e pode servir ao que é benéfico para a coletividade ou para o que traz malefícios e sofrimentos, como as notícias fake.
Já se sabe que a natureza exige proteção, cuidados constantes e que não é infinita. No caso do Rio Grande do Sul, pelos artigos que agora despontam, há indicações de que centenas de leis ambientais foram flexibilizadas nos últimos anos em favor de ganhos imediatos e insustentáveis. Não só quem propôs deveria ser responsabilizado, mas todos que votaram a favor desses descalabros. São eles os vilões e não a natureza, que responde às violações que sofre.
Parece apropriado defender a ideia de que a comunicação com base em ciência deve se aliar à educação e à tomada de decisões em um portal de notícias como CRIATIVOS!, editado pela Cedro Rosa.
Cada site atinge públicos diferentes, e com isso pode-se propagar ideias que ajudem cidadãos em posições distintas a refletirem sobre suas escolhas. Precisamos de caminhos promissores e esses dependem de conhecimentos científicos divulgados em linguagem acessível para que todos compreendam, inclusive tomadores de decisão.
O maior desafio talvez seja aprendermos a eleger quem se importa. O se importar nesse momento é fundamental, pois nosso futuro depende de escolhas responsáveis que favoreçam a sobrevivência da vida nesse planeta.
O que se passa no Rio Grande do Sul (maio de 2024) não precisava ter tomado as proporções que tomou. É importante adotarmos medidas que evitem futuras tragédias como esta. Infelizmente, se nada for feito, a ciência prevê eventos climáticos extremos cada vez mais frequentes e intensos, que teriam a possibilidade de ser evitados se a humanidade apenas ouvisse aqueles que sabem. É escutar a ciência para planejar ações que priorizem a vida e, assim, poderemos vislumbrar um futuro sustentável ainda possível nesse planeta.
Algumas informações que me inspiraram a escrever esse artigo estão nos links abaixo:
"O que acontece no Rio Grande do Sul é consequência da ação humana, da irresponsabilidade e do descaso", diz cientista.
A hegemonia política do agronegócio e o desmanche das leis ambientais transformaram o RS no epicentro da crise climática global
Eduardo Leite cortou ou alterou 480 pontos do Código Ambiental do RS em 2019
Ciência como caminho pra não sofremos com crises climáticas...
Suzana M. Padua
Nota da redação
A CRIATIVOS! tem publicado artigos sobre a tragédia no Rio Grande do Sul
Burrice, de José Luiz Alquéres
Catástrofe Climática, de Aecio Barbosa de Oliveira
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A Cedro Rosa Digital é uma plataforma que oferece músicas e trilhas sonoras certificadas para diversos segmentos da indústria audiovisual. Ela apoia a cadeia produtiva da música independente, permitindo que artistas independentes lancem suas músicas para o mundo.
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