Deitado Espero - Esse espaço infinito comigo
“Ficar deitado na cama seria, tudo considerado,uma perfeita e suprema experiência se ao menos tivéssemos um lápis de cor longo o bastante para desenhar no teto. Mas não é normal encontrarmos um aparato como este, à mão, entre os utencílios domésticos. Acho que a coisa poderia ser resolvida com algumas latas de tinta e uma vassoura; só que, se alguém trabalhasse assim, com largas varreduras, como os mestres,espalhando as cores em grandes movimentos, a tinta respingaria de volta no seu rosto como estranha chuva encantada, o que poderia ser uma desvantagem.”
(Deitado na Cama - G. K. Chesterton)
Antes mesmo de ler este conto, eu já tinha avisado a parentes e amigos que encerraria meus dias deitado numa cama, olhando para o teto e definhando.
A vantagem que vejo no meu método sobre o de Chesterton é que ele não me exige mais do que a imaginação, sem a necessidade de tentar equilibrar um lápis de cor gigante ou uma vassoura chorona, enquanto procuro criar alguma imagem que fique para a posteridade, sem esquecer de evitar os respingos de tinta.
Além do mais, sempre fui um desastre nas artes do desenho e da pintura, mesmo cercado de todas as condições ideais para tal – imaginem eu nessa posição bizarra.
Porém, o que mais importa é a possibilidade de ver o teto se fazer infinito se transformar em estrelas, constelações e galáxias.
Mirando a tela em branco no alto do meu quarto posso lembrar das estórias e da História.
E até criar algumas Histórias paralelas, só para mim.
Naquele canto do teto estarão Zeli, Mário e Kklo (minha mãe, meu pai e meu irmão), me esperando com o almoço de domingo e um bate papo prazeroso e sem fim, regado a doces e cafezinhos.
Bem ao lado, tias, tios, primas e primos se cruzando numa correria louca e numa gritaria infernal – é São João em Campo Grande, bem aqui na antiga Zona Rural do Rio de Janeiro, com direito a fogueira, balões e batata doce assada na brasa.
No lado oposto estarão amigas e amigos de infância, com brincadeiras de pipas, bolas de gude, peladas intermináveis e pique bandeira.
E pegar jacaré nas ondas de Copacabana.