Chico Buarque não compôs Roda Viva. Fui eu...
Dia desses citei aqui o samba ‘Sonho Estranho’, de Moacyr Luz e Chico Alves. Uma obra prima do gênero que reflete com maestria o esquisitíssimo tempo pelo qual estamos passando. Quando enfim, acordarmos desse pesadelo de quatro anos, sem dúvida, a obra desses craques já será história. E servirá para que as futuras gerações tenham uma noção do que foram esses tempos surreais e obscuros por que passamos, e que, esperamos, não voltem nunca mais.
Ainda na manhã de ontem eu refletia sobre tantas dessas esquisitices que nos rodeiam, quando Robespierre, o papagaio que um amigo paraense trouxe de Caiena pra mim, começou a gritar do alto do poleiro naquele seu francês estridente: Allez les Bleus, Allez les Bleus. Copa do Mundo, eu deduzi. Esse bicho é mais antenado e mais lúcido do que essa gente que está acampada e pegando chuva na frente dos quarteis ou cantando o ‘Ouvirundu’ para um pneu de caminhão.
Mas longe de mim achar que as tiradas surrealistas sejam exclusividade das pessoas simples que zanzan por aí hipnotizadas por um tipo esquisito de seita. Essa gente que é bancada e serve de bucha de canhão para uns espertos. Não. Há gente mais aparelhada intelectualmente, ou que pelo menos deveria estar, que também produz defecações risíveis – se é que isso é possível. É o caso da juíza, que por esses dias se contrapôs a uma ação movida por Chico Buarque pelo uso indevido de uma de suas composições mais celebradas, ‘Roda Viva’. Na sentença a meretíssima coloca em dúvida a autoria de Chico.
Para o leitor entender mais esse absurdo nessa nossa atual República do Absurdo: Chico Buarque entrou com uma ação contra o deputado federal Eduardo Bolsonaro pelo uso da música ‘Roda Viva’ em uma postagem na qual eram exibidas imagens de bolsonaristas processados por atos antidemocráticos. Na peça, a legenda: "Brasil está sob censura". Aí vem a juíza e duvida que Chico é, de fato, autor da canção devido “ausência de documento indispensável à propositura da demanda, qual seja, documento hábil a comprovar os direitos autorais do requerente sobre a canção ‘Roda Viva’”.
Na minha visão de leigo ao interpretar um artigo do Código de Processo Penal, que diz que o ônus da prova cabe a quem acusa, entendo que a juíza é quem deveria apresentar provas de que Chico está mentindo, já que pela sentença exarada por ela cabe o entendimento de que o compositor está mentindo, e por tanto, passaria à condição de réu ao processar um inocente. A defesa de Chico apresentará uma nova ação, idêntica, mas com ainda mais provas da autoria de Chico: “Embora se trate de fato público e notório, que independe de produção de provas”. É mole?
Com certeza a magistrada tem influência daquela fraude intelectual chamada Olavo de Carvalho, guru de Bolsonaro e sua turma. Ele que chegou a duvidar que os Beatles compunham suas canções depois de ler um holandês alucinado que afirmou que o filósofo alemão Theodor Adorno seria o autor das canções da banda, já que John, Paul, George e Ringo eram semianalfabetos em música. É a assustadora realidade paralela que estamos vivendo. Olavo de Carvalho já morreu (já foi tarde) mas sua influência ainda se percebe por aqui.
Robespierre interrompe minhas reflexões repetindo altissonante: “Liberté, Égalité, Mbappé, Liberté, Égalité, Mbappé”. Vai começar o jogo da França. Fico por aqui. Volto na semana que vem. Mas creiam, Beethoven é autor da Quinta Sinfonia.
“Vai passar nessa avenida um samba popular Cada paralelepípedo da velha cidade Essa noite vai se arrepiar (...)
Ai, que vida boa, olerê. Ai, que vida boa, olará O estandarte do sanatório geral vai passar Ai, que vida boa, olerê. Ai, que vida boa, olará” (Vai Passar – Chico Buarque. Eu acredito)
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