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Foto do escritorMario Lago Filho

Autópsia



A minha autópsia revelalará várias mortes.

Suicídios, atentados, punhaladas nas costas.

Talvez até revele a primeira vez que morri.


Quando eu brincava de pipa, morri cada vez que "cortaram" meu pião - era assim que chamávamos no Campo Grande da minha infância.


E eu era muito ruim no "bola ou búlica", o que me provocou diversas mortes.


O nascimento da minha filha e do meu filho foram pra mim um tipo de morte.

Daí, houve a separação e então morri.


Amores e desamores foram um jeito de morrer.


E teve aquela vez em que me acreditei imortal e permiti que minha imortalidade fosse testada ao limite, até ser desmentida.


Me embriagar e me drogar desbragadamente com certeza foram auto-assassinatos.


Bem como quando deixei de ser virgem e não foi tão bom quanto eu imaginava.


E cada medo e cada raiva e cada dor, o que foram?


Mortes.


Naquele dia em que perdi aquele gol e naquele outro dia em que levei aquela pedrada na cabeça eu certamente fui vítima de morte.


E quando caiu meu primeiro dente?

E quando tive todas as doenças?

E quando me deparei com minha própria insignificância?


E quando saí do útero da minha mãe e descobri que já estava morrendo?


Até a próxima esquina.