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Foto do escritorMarcelo Madureira

Artigo: A Arte no Covidário

Marcelo Madureira , para Criativos / CR Zine

Foto: Marcelo Madureira, gravando podcast na Cedro Rosa.


No final de 2019 fui convidado para fazer uma participação na comédia Abestalhados – 2 , direção de Marcelo Botta e Marcos Jorge.

Depois de ler o roteiro , por sinal muito bem escrito e ter me identificado com o personagem, topei a empreitada. As filmagens começaram em fevereiro de 2020 e deveriam terminar em março do mesmo ano.

Fui a São Paulo onde filmei algumas cenas e voltei para o Rio , aguardando ser convocado para as restantes. Deu ruim. A produção de Abestalhados 2 foi alvejada em cheio pela pandemia do Covid-19 e teve que ser interrompida bem na metade. Fiquei desolado. Não só pela incompletude de uma obra artística , mas solidário com os produtores , elenco , técnicos , enfim todos os envolvidos no projeto suspenso pela metade, inconcluso.

Trancado em casa desde o dia 15 de março, recebo um e-mail de Abestalhados 2. Alvíssaras ! “As filmagens serão retomadas em breve dentro dos patrões e protocolos sanitários exigidos pelas circunstancias de isolamento social.” Anexo um arquivo que se fosse impresso teria a espessura de um catálogo de telefone ( lembram deste objeto ? ) com todas as normas , procedimentos e recomendações para a retomada dos trabalhos. Confesso que não tive a pachorra de ler toda aquela ingrisia.

Quando já estávamos no mês de agosto, finalmente, chega a minha nova programação de filmagem . O roteiro original teve que ser adaptado e só me restavam duas cenas pequenas. Antes de qualquer coisa, a produção providenciou um exame de covid-19 para verificar se , por acaso, eu estava infectado. O exame tinha que ser feito 72 horas antes de rodar a câmera. Como o exame anterior, este também deu negativo. Só assim pude embarcar num avião lotado para São Paulo sem que me tivessem sequer aferido a temperatura basal.

Era a primeira vez que viajava depois da quarentena e na chegada em Congonhas fiquei impressionado como o terminal, sempre tão movimentado , e quase vazio num silêncio soturno e estranho. Fui direto para o hotel de onde só saí para jantar , perto da Avenida Paulista.


Aproveitei para espiar a mais famosa artéria paulistana sempre fervendo de gente e vida, não importa a hora do dia. Pois bem , famosa” Paulista” , por volta das dez horas da noite , se encontrava deserta e escura. A visão impressionante dos edifícios de escritório feericamente iluminados não existe mais. Todos dormindo no mais profundo breu. Poucos pessoas circulando, de aberto só as farmácias, nem mesmo as enormes bancas que antigamente vendiam jornais e hoje vendem de tudo. Confesso que fui para a cama meio deprimido.

No dia seguinte , pela manhã, vieram me buscar para as filmagens que estavam sendo realizadas em Cotia , mais ou menos a uma hora do centro de São Paulo. Chegando no estúdio já percebi as enormes mudanças nestes novos tempos viróticos de isolamento social. Antes de qualquer coisa você é examinado por um médico, em seguida fica isolado numa sala , esperando ser convocado pelo figurino e pela maquilagem que atendem um de cada vez. Máscaras , anteparos , luvas e álcool gel completam o ambiente. Até mesmo as refeições são feitas em baias isoladas , onde se recebe um pacote com a comida esterilizada.

Na hora da cena o artista é chamado ao set , devidamente mascarado e só pode tirar a cobertura facial no momento em que vai rodar. Ou seja , as marcações de luz , movimentos de câmera , ensaio de texto, tudo tem que ser feito usando as proteções protocolares. A cada tomada um profissional de saúde presente no set troca obrigatoriamente as máscaras dos atores. E por aí vai , o filme vai sendo realizado num ambiente mais asséptico do que uma sala de cirurgia. Tudo em favor da segurança sanitária da equipe , não há o que se discutir. Tudo pela arte.

Mas fiquei pensando...como será o futuro da arte cinematográfica ? As filmagens que sempre tiveram algo de troupe circense , de alegria, de colaboração e de convívio que acabam colaborando no resultado final ? Como filmar , gravar , compor , tocar, representar isolado do público , dos colegas ? Haverá arte ?

Será diferente , sem dúvida. O artista sempre faz a arte possível , se adapta as circunstancias mas faz questão de dar o seu recado. É o seu compromisso com a Sociedade , é o que dá sentido à sua vida. Mas terá o mesmo impacto ? A mesma assertividade ? O efeito estimulante e intrigante ? Ainda consegue provocar o desassossego em nossas almas ?

Fiquei pensando também que a Arte não é só o artista que sobe no palco , o músico que dedilha o instrumento , o palhaço que conta uma piada. Por trás da ribalta existe uma cadeia de gente que vai do cabo man , auxiliar de palco , contra regra , iluminador , maquinista, maquiador , figurinista , fotógrafo , direção e seus assistentes , produção...enfim é um monte de gente , mães e pais de família , trabalhadores incansáveis , que entendem e amam o propósito do que fazem e para isso não medem esforços. Tudo isso sem compartilhar os aplausos , a glória , o triunfo do sucesso.


E esse povo como fica ? Sem trabalho ? Sem esperança ? Sem arte ?


 

Marcelo Madureira é humorista e jornalista. Um dos fundadores do "Casseta e Planeta", holding das "Organizações Tabajarra".


Podcast

Participam Marcelo Nínio e Tuninho Galante. Produção: Cedro Rosa


 


A partir de R$ 25.


 

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